Simplicíssimo

Lã e Água

Entra correndo pela ruela espremida entre prédios. Antes da curva, três homens encostados na parede úmida, fumando crack. Diminui o ritmo. Finge que não os vê e esconde os pulsos amarrados. Ao cruzar pelas figuras, percebe que estão armados. Depois de quatros passos desata a correr. Certamente chamou a atenção. Ignora o fato e continua correndo. Há de chegar. Dobra na segunda esquina e encontra um beco. Escuro. Gritos saindo da janela do prédio com a parede descascada. Melhor voltar. A respiração cada vez mais ofegante, as pernas cansadas. Não pode parar. De onde está, já consegue ver os três homens. Eles levantam-se e aguardam pela sua chegada. Pula para o vão que se abre ao lado da ruela, pendurando-se na tesoura que sustenta a escada. Olha pra baixo. A escada se perde no escuro. Já não agüenta mais o peso do próprio corpo. Os três homens chegam à beira do vão e começam a atirar. Falta campo de visão para acertarem o tiro. Buscam melhor posição, descendo a escada. Escorrega pelo cano perpendicular à tesoura.
Acorda na segunda fileira de bancos automotivos. Ambiente claustrofóbico. Um desconhecido parece estar morto no banco a sua frente. Cortinas fechadas. Com as mãos ainda atadas sacode o corpo na tentativa de reanimá-lo. Finalmente acorda.
– Pára. Não vê que eles vão nos encontrar?
Espia pela cortina e vê um batalhão de freiras subindo para o ônibus ao lado. Todas com barba por fazer. O carro a andar. O homem do banco da frente também tem as mãos atadas, mas mesmo assim começa a escovar os dentes. Ignora o discurso do estranho. Está dentro desse carro com as mãos atadas, provavelmente já o pegaram.  Pergunta ao desconhecido onde estão indo. O verme apenas ri. Gruda-o pelos cabelos e quebra a janela com a cabeça do infeliz. Na mão oposta da rua vem um caminhão, também cheio de freiras. O motorista, ao perceber o vidro quebrado, da meia volta e segue em perseguição. Retira os cacos de vidro e pula a janela com o carro em movimento. Entra correndo pela ruela espremida entre prédios. Antes da curva, três homens encostados na parede úmida, fumando crack.

Mauro Paz

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