1. Pelas suas contas já havia mandado para Deus (ou, talvez, para o diabo) mais de quarenta almas. Aproximadamente o mesmo tanto de botões que compõem o buquê com o qual desce agora a rua de sua infância a caminho de casa.
Vai ao encontro daquela a quem é dedicada este dia de maio.
Matadores de aluguel também têm mãe.
2. “Mamãe, eu vi um gatinho no pomar. Posso ir até lá brincar com ele?”
“Claro que pode, meu bem. Só não se afaste muito. Já está escurecendo…”
A filha saiu pulando de alegria.
Horas mais tarde, era o coração da mãe que pulava, mas de aflição. Por onde andaria a sua filha?
Nunca mais ninguém a viu.
O desaparecimento da menina coincidiu com o sumiço das pegadas da suçuarana que há dias rondava a fazenda.
3. A criança escuta estranhos ruídos vindo do quarto da mãe. Corre para lá. Ao abrir a porta, vê através da semi-escuridão do quarto, um vulto fugindo pela janela.
Imediatamente a mãe puxa a coberta até pescoço.
“Mamãe?”
“Não tema, querido. Ele já foi embora.”
“Mas quem era?”
“Um ladrão, filho.”
“E ele fez algo à senhora? Roubou alguma coisa?”
“Não, meu anjo. Ele não me fez nada, não roubou nada.”
Enquanto isso, debaixo da coberta, as mãos dela traiam suas próprias palavras. Ao tempo em que uma descia pelo ventre para se aninhar entre as pernas nuas e lassas, a outra subia até o peito, a fim de conferir se o coração ainda estava lá.
Comente!