Simplicíssimo

A BÍBLIA DEMON’S [TRADA] -Versão do Diretor

 

NA ARCA
 
 
 
Na Arca Nãoé conversava com seu filho SEM(tado), também chamado, segundo a situação, SEM(coragem), SEM(iniciativa), que assim fora denominado por inspiração Divina, uma vez que Deus sabia de antemão que quando ele estivesse na arca ele estaria sempre SEM(ânimo) para fazer nada.
 
 
1.       Papai!
2.      O que é meu filho?
3.     É certo que tenhamos deixado tantos casais de animais por embarcar? Não temes que o Senhor Deus de nossos ancestrais descubra e nos castigue?
4.     SEM (noção), meu filho, olha à tua volta. Mal podemos nos mover. Se me viro para um lado recebo na cara uma baforada fedorenta de alguma fera, se me mexo pra outro lado tenho a bunda espetada por chifres de algum outro bicho! Como tu querias que eu seguisse à risca as determinações divinas e embarcasse todos os animais?
  1. Isso lá é verdade… Ui! [grita SEM(argumento) ao levar um coice de um veado que estava junto a ele].
  2. Por falar nisso, papai pode ficar tranqüilo, que eu matei aquele casal de Pica-Paus e o casalzinho de Cupins também, como me recomendastes!
  3. Muito bem. Mas meu filho, eis que já é noite e chegada é a hora de tornarmos para perto de nossas esposas. Eu por meu turno to que não me agüento, pois depois de passar o dia inteiro assistindo estes animais copulando sem trégua, to doido pra “chegar junto” na velha!
  4. Eu também, veio, vamos lá!
  5. Então até amanhã SEM (sono), meu filho.
 
 
E dizendo isso, NÃOé, começou a se arrastar por cima do dorso dos animais amontoados por toda parte na Nave, e ia ouvindo os seus grunhidos, piados e rugidos, enquanto passava em cima deles.
 
 
 ***
[NÃOé acordando ao lado de sua mulher, ambos rodeados por muitos animais].
 
Na manhã seguinte NÃOé foi despertado pela barulhada dos bichos e pelo jato de vômito que sua mulher despejava-lhe em cima.
 
 
1.     Arrrghhhh! Credo, o que é isso, mulher?!
2.     Ai, ai, ai, me desculpe, meu marido, mas não agüentei segurar. Não posso mais suportar isso aqui! Este barco sacolejando sem parar, este fedor terrível de fezes e urina dos animais, a própria catinga que sai deles, esta barulheira dos infernos que eles fazem, dia e noite, sem um minuto de silêncio! Ai, ai, ai, porque você foi nos fazer embarcar? Eu preferia ter morrido!
3.     Não blasfemes mulher!
4.     Blasfemo, blasfemo, blasfemo o tanto que eu quiser seu velho desgraçado! E como se não bastasse todo este meu sofrimento, ainda tenho que agüentar você em cima de mim toda noite, dizendo que não pode evitar, porque fica excitado vendo estes animais safados se cobrindo o dia inteiro! [gritava a mulher, ensandecida]. Você devia se envergonhar seu imprestável! Seiscentos Anos e essa merda não amoleceu ainda!
5.     Ué, eu devia é ter orgulho então, ih, ih. Ih.
6.     Você se ri, né, mas você me paga! Ô sina minha, viu! Ah, mas ainda vou orar, fazer novena, pagar promessa, sair em procissão, qualquer coisa eu faço pra que Deus atenda o meu pedido e faça o Varão amolecer e perder suas forças de uma vez, no máximo, quando muito, ali pelos setenta anos. Eu sei que não vou viver pra ver estes dias felizes, mas no futuro todas as gerações de mulheres me chamarão Bem-Aventurada! Desapareça daqui, suma de perto de mim seu velho fedido! E me escute bem, a partir de hoje se quiser saciar seu instinto baixo vai ter que ser com um destes bichos aí que são tão tarados quanto você. Se te aproximares de mim de novo, esta porcaria que tens aí entre as pernas vai virar ração pras galinhas![Gritava a mulher de NÃOé, enquanto brandia um facão afiado apontando para o membro do marido, ao mesmo tempo em que o fuzilava com o olhar raivoso].
7.     Ta bom, querida, ta bom. Mas não fique tão nervosa. Veja, nós só estamos na Arca há alguns dias e Deus disse que só de chuva seriam quarenta dias e quarenta noites. Pelos meus cálculos, até passar a tempestade e a enchente abaixar, acho que vamos ficar aqui mais ou menos um ano. Você vai regular este tempo todo, velha?
8.     Velha é a meretriz da senhora sua mãe! Ordinário, traidor, você falou que seria pouco tempo. Eu não queria vir e você me enganou!
9.     Mas meu amor.
10. Meu amor tua avó![avançando pra NÃOé, balançando a faca].
11.  Mas você teria morrido.
12.  Estaria muito melhor morta do que sepultada viva nesta tumba navegante, nesta latrina gigante! Ai, ai, ai não agüento mais, não agüento mais![berrava desferindo golpes no ar com o facão, tentando atingir as galinhas que ciscavam ali por perto].
 
 
NÃOé, assustadíssimo, afastou-se rapidamente rastejando-se por sobre os animais, até ir parar no lado oposto ao que a sua mulher se encontrava. No caminho ia afundando os pés, as mãos, ou às vezes caía de cara nos excrementos amontoados nos minúsculos espaços entre os corpos dos bichos. À medida que ele passava, os animais iam se afastando e movimentando-se. NÃOé reclamava então:
 
1. Aí de mim Senhor. O que fostes arranjar para o teu fiel servo Nãoé! Tu és Deus ou não é?! Não podias simplesmente ter estalado os dedos ou assoviado, e assim, transformado os homens maus em homens bons? Porém, se querias preservar o livre-arbítrio, não era mais fácil fulminar os maus como o raio faz com a árvore? Acaso não és tu maior e mais poderoso do que os raios? Ou não podia ter dado cabo deles com um discreto ataque cardíaco nos seus próprios leitos, não seria pelo menos mais humana, quero dizer mais Divina, esta maneira, do que deixar que todos se afogassem. Porque, meu Deus, por quê?!?
 
 
E assim transtornado, NÃOé, perdeu os sentidos e caiu entre um casal de camelos que o observava enquanto ruminavam indiferentes.

Mephistopheles Pionus Maximilliani

Comente!

Deixe uma resposta

Últimos posts

Siga-nos!

Não tenha vergonha, entre em contato! Nós amamos conhecer pessoas interessantes e fazer novos amigos!

Últimos Posts