Para que serve a poesia?
– Anibal Beça
De servir-se utensílio dia a dia
utilidade prática aplicada,
o nada sobre o nada anula o nada
por desvendar mistério na magia.
O sonho em fantasia iluminada
aqui se oferta em módica quantia
por camelôs de palavras aladas
marreteiros de mansa mercancia.
De pagamento, apenas um sorriso
de nuvens, uma fatia de grama
de orvalho, e o fugaz fulgor de astro arisco.
Serena sentença em sina servida,
seu valor se aquilata e se esparrama
na livre chama acesa de quem ama.
* * *
Anibal Beça
vem abrir este caminho.
Poeta de vida plena, sorriso largo,
generoso com os amigos, pródigo ao espalhar poesia, sempre.
Sua arte traz pequenos detalhes da vida amazônica, principalmente nos haicais ficamos próximos dos bichos e plantas, do clima, nos sentimos entre
as ‘Folhas da Selva’:
Alheia ao banzeiro
pousada na vitória-régia
a jaçanã come
* * *
A sumaumeira –
despacha na paina branca
recados da selva.
* * *
Flauta na floresta –
o vento sopra nos furos
do bambu brocado.
* * *
Sede de verão –
o mormaço bebe orvalho
nas folhas de tajá.
* * *
Auréola bendita
escondida no capim –
ninho de nambu.
* * *
Autor de Poesia farta e fluida, preciosa,
que sempre ao ser relida
desperta novos sentidos e harmonias
no entretecido de seus versos.
Pulsa Manaus, a liberdade de viver, o amor, a ternura,
o cidadão do Universo !
* * *
Picadeiro
– Anibal Beça
Que toda la vida humana / representaciones es.
Calderón de La Barca
Estava sossegado lá no fundo
do meu eu e de mim sem muita pressa
nesses momentos calmos que circundo
roteiro e enredo em ato que começa
minha descida ao palco do meu mundo
que venho e represento a farsa dessa
Comédia que é de arte em que aprofundo
a pena desgarrada em vã promessa
de bem cantar somente o mais fecundo
sonho sonhado sem a dor expressa
que a vida vai me dando num segundo
o desempenho em títere da peça
neste papel de doce vagabundo
que me faz rir da dor doída à beça.
* * *
Cadê você ?
– Clarice Villac
vai brotando de permeio
uma saudadinha assim
interpenetrando os planos,
os sons, dimensões, em mim
contornos indefinidos,
de emoções e sentidos,
nesta vida, trampolim.
* * * * *
Cantos de Hamadríade
– Clarice Villac
De dentro da árvore
pressinto teu cantar
imagino teu caminhar
no sussurrar do vento
inspirado argonauta da poesia
tua arte é minha companhia
transporto-me pra teus bosques distantes
saboreio teus orvalhos
matizados como beijos furtacor
plenitude tutti-frutti
ritmos bailados
com a intensidade da emoção
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Referências:
– “Para que serve a poesia?” – Anibal Beça, in 50 Poemas Escolhidos pelo Autor. Rio de Janeiro, Ed. Galo Branco, 2007, p.28.
– Haicais – Anibal Beça, in Folhas da Selva. Manaus, Ed. Valer, 2006.
– “Picadeiro” – Anibal Beça, in Palavra Parelha. Rio de Janeiro, Ed. Galo Branco, 2008, p.166.
– pt.wikipedia.org/wiki/An%C3%ADbal_Be%C3%A7a
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