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A IMITAÇÃO DE CRISTO: TENTAÇÕES & DISTRAÇÕES

No início do século passado, o escritor grego Nikos Kazantzakis, autor de A última tentação de Cristo, escreveu em seu prefácio ao livro:  

A substância dual de Cristo, o anseio tão humano, tão super-humano, que o homem tem de alcançar Deus, foi sempre um impenetrável mistério para mim. Minha maior ansiedade e fonte de toda alegria e de toda angústia desde a minha juventude foi o incessante e impiedoso conflito entre o espírito e a carne. E a minha alma é o local onde estas duas armadas se combatem e se encontram.

Aqui, de uma bela forma literária, está descrito o conflito comum a todas as pessoas. Ou pelo menos, a batalha que, em algum dia todos nós teremos de enfrentar.

Segundo a tradição cristã, ancorada na Bíblia, Jesus Cristo Homem enfrentou todas as nossas tentações, entretanto, sem cair em pecado.

Desta forma, Cristo sabe muito bem das nossas lutas e dos nossos esforços contra o pecado – compreendido como um ato que nos separa ainda mais de Deus – assim como está familiarizado às nossas vitórias e derrotas. 

Grande parte das tradições religiosas que existe no mundo de hoje compreende este conflito a partir da necessidade do ser humano de superar a sua natureza animal, relacionada à busca de satisfação de nossas necessidades básicas – alimentação, abrigo e sexo, por exemplo – e a tentativa de alcançar uma esfera superior, onde o ser humano não existe apenas para realizar estas necessidades.

Quando essas necessidades nos dominam e tornam-se o principal combustível da existência, então, estamos diante do pecado. E o pecado se torna real a partir da tentação.

A tentação é de nossa produção: nós lhe damos forma, sabor, perfume e cores, com base em nossos desejos. A tentação nunca é branca-e-preta.

O conflito, então, reside na luta entre nossas duas naturezas: uma animal e outra, espiritual. 

Para ajudar seus devotos a vencerem esta batalha, sistemas religiosos ao longo da História criaram um arsenal de técnicas – de oração e de ascetismo – reunidas em torno do termo genérico "exercícios espirituais".

O Budismo, por exemplo, propõe o desapego e a meditação. O Hinduísmo, em sua versão brâmane clássica, a completa ausência de confortos e bens materiais.

No Cristianismo, religião que tão bem soube aliar sua origem oriental com a filosofia ocidental, criando uma nova visão do mundo, que se tornou política-econômica-militarmente hegemônica, sempre houve a compreensão de que os bens materiais – e o dinheiro, principalmente – eram malévolos. Desta forma, foi possível a existência de movimentos ascéticos ao longo de toda a história da Cristandade.

Alguns grupos cristãos, como os cátaros – grupo que existiu na França medieval, até ser cruelmente exterminada pela Inquisição católica, acusada de heresia – por exemplo, propunham a separação completa entre o devoto e o resto do mundo, ainda que os cátaros vivessem em comunidades. 

Outra possibilidade é o monasticismo, onde o cristão, o monge,  se propõe a buscar a Deus em solidão.

Em última instância, a proposta cristã é de que o devoto – aquele que crê –  busque imitar a Cristo em sua vida cotidiana, em todas as atividades que exerça em seu dia a dia.

Com base em minha modesta experiência pessoal, posso afirmar que isso é extremamente difícil.

No dia a dia, enfrentamos uma série de distrações e outros problemas, que nos ocupam a mente. E a mente ocupada demais, ao contrário do que diz o ditado popular, também pode ser uma forma de derrapar nas estradas da vida.

Entretanto, obviamente, a principal dificuldade que qualquer pessoa enfrenta é a da tentação, aqui entendida como o desejo de fazer aquilo que não se deve fazer. Aquela vontade quase irresistível de fazer aquilo que prometemos a nós mesmos que iríamos manter distância…

No meu caso, que, felizmente, conheço minhas limitações, a resposta é simples: eu não enfrento as tentações; eu fujo delas.

Sei do meu coração. E sei muito bem dos tipos de desejos e vontades que se escondem nele.

Por isso, atravesso a rua quando vejo a tentação sorrindo na próxima esquina.

Paz e Bem!

Thiago Fuschini

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