{14/06/2000 – Quarta-feira – 23:53}
Hoje o dia foi corrido: acordei cedo, tomei banho, fiz a barba e fui para o Hospital. Durante a manhã, a Emergência estava tranqüila. Deu até para fazer uns fluxogramas de exames para o Hospital. Ao meio dia teve reunião na AMERGHC (Associação dos Médicos Residentes do Grupo Hospitalar Conceição), onde apresentei as decisões do XXXIV Congresso Nacional De Residência Médica e discutimos a paralisação nacional dos residentes de 20 de julho próximo. Depois voltei para a Emergência. Atendemos uma parada cardíaca ( o paciente acabou indo a óbito) e fui correndo discutir os fluxogramas que fiz com o Dr. Sério: vamos padronizar novos fluxogramas de exames no Hospital. Fui de lá em um pulo para o Ambulatório, atendi meus pacientes e fui para o meu médico para retirar os pontos da minha cirurgia (eu nem contei da cirurgia que fiz no dia 3, mas tudo bem…). De lá passei em casa só para dar um oi para mamãe, me penteei e fui correndo para a AMRIGS para a criação do Departamento de Médicos Residentes – D.M.R. ou DEMENTES – da AMRIGS, da qual tornei-me sócio-fundador e provável membro do Conselho Consultivo (ainda faremos uma Assembléia para decidir isso). Agora, acabei de vir da Churrascaria Schneider, onde tinha uma janta oferecida pelo laboratório Sanofi, pelo medicamento Clopidogrel.
Tenho que voltar a escrever minhas poesias. Acho que estou meio sem tempo para mim. Não estou conseguindo nem tocar violão ou guitarra direito. Acho isso ruim… Agora, assim que acabar “Os Simpsons”, vou dormir. Tchau! {15/06/2000 – Quinta-feira – 0:09}
{16/06/2000 – Sexta-feira – 22:04}
Caros colegas leitores, estou teclando diretamente de Agudo, capital mundial do terceiro milênio, direto para o Mundo. É incrível como lidamos com nossos sentimentos… Na fase em que estou, não tem nenhuma guria da qual eu goste especialmente. Tem uma que eu gosto de estar com, tem outra que eu gosto de conversar com, tem mais outra que eu gosto de transar com, tem uma que eu gosto de pensar em, tem uma ainda que vive a me ligar, e assim por diante… No meio desses amores práticos, platônicos, patéticos e passionais, minha cabeça e meu coração não conseguem se encontrar. É uma lástima. Mas as coisas vão se ajeitar, estou tendo um pressentimento.
Agora estou a ver o Show do Milhão no SBT. Incrível como algumas pessoas não sabem algumas coisas ridiculamente fáceis. “Defenestrar” : jogar algo pela janela. À pouco, vi uma casa com piscina, muito linda na TV, que nunca poderei comprar trabalhando como médico. Talvez conseguisse se fosse participar do Show do Milhão. Daqui a pouco vai passar o filme “Mentes Perigosas” com a Michelle Pfeiffer. Vou comer um milho cozido e volto já…
…já voltei! Uma coisa interessante que vou experimentar hoje é escrever de acordo com o livre pensar: simplesmente vou escrevendo coisas que vêm à minha cabeça, não importando nexo entre as sentenças nem regras da Língua Portuguesa. Vamos tentar.
Mentes perigosas são aquelas que pensam perigosamente ou que pertencem à pessoas que são de alguma forma perigosas? Certas músicas conseguem encaixar perfeitamente em uma cena ou situação e quando a ouvimos novamente lembramos com exatidão daquele momento que fazia até então parte do passado. O mesmo acontece com os cheiros. Diga-me porque estou aqui, tão cego para ver as coisas que acontecem ao meu redor, as coisas que acontecem para você e para mim. Será que estou no paraíso, e a luz ofusca meu olhar e cobre tudo que não é digno de ser visto. Giro em torno de mim mesmo para tentar me encontrar e tudo que acho é um alfinete sem cabeça. Mulheres loiras são bonitas, mas eu gosto igualmente das morenas e das ruivas. Que tal ganhar US$ 24.700 por ano para ser professor de segundo grau? Já descobri que não sou muito bom nessa coisa de livre pensamento, mas vou continuar pensando… …e escrevendo.
Eu continuo em uma fase de construção: construção de conhecimento, de bens materiais, da personalidade (finalizando minha identidade), das relações amorosas, construção de contratos sociais e assim por diante. Acho que eu também gostaria de construir um corpo com uma aparência legal para mim…
Liberdade, liberta-te, liberalidade, libera a idade, ali a beira da deliberação, liberação de idade mínima e máxima para fazer ou desfazer aquilo ou isso que podemos ou não dizer ou desdizer a respeito ou desrespeitosamente sobre a liberdade. Sucesso! {16/06/2000 – Sexta-feira – 23:04}
{18/06/2000 – Domingo – 19:45}
“Não me pergunte o que eu não sei responder… São coisas que a vida faz a gente sofrer…” Violência. Reféns presos em um ônibus. Jardim Botânico, Rio de Janeiro. Policiais e um bandido armado. Tensão. Morte fingida. Desespero, angústia. O assaltante sai do ônibus com a refém. É cercado por policiais. Um policial tenta atirar no bandido. Suspense. O bandido descarrega a arma na refém. Ela é lavada ao Hospital. Ele é levado no camburão com policiais. Ela recebeu três tiros. Morreu. De verdade. Ele não recebeu nenhum tiro. Morreu. Sufocado. E a violência continua. E as leis continuam a ser feitas. E elas funcionam cada vez menos. Novas leis tem de ser feitas para regular as primeiras. E o caos continua se instalando. Falência moral. O ser humano está em um estado de degradação. Se leis têm que ser feitas, é porque existe algo de muito errado com a consciência individual e da sociedade. Leis não significam avanço da civilização. Leis significam a queda de uma cultura, de um grupo humano. As coisas vista pela janela são bem diferentes daquelas vistas através da janela, mas sem o vidro. Devemos ver através da janela. Muitas pessoas mantém a janela fechada. Elas não vem o mundo como ele realmente é. Muitas pessoas constróem várias janelas. Algumas com vidro fosco, outras com vidros coloridos, esculpidos, jateados com areia ou mesmo simplesmente transparente, mas que não mostram as coisas como realmente são, mas sim como elas aparentam aos sentidos, deturpados pela lente da janela. As pessoas morrem. E vão continuar morrendo. E o problema não é esse. É a forma. É o sentimento. É o como e o porquê. Morrer depois de ter-se esgotado em prazer ou sofrimento é fisiológico. Morrer com a sensação de algo inacabado é fatalidade. Morrer sem saber por quê é em vão. Morrer por um bom motivo, dizem alguns, é a redenção. A definição de bom motivo é que é o problema. De boas intenções e de bons motivos o mundo está cheio. Apesar de não sabermos o que são. Definir as coisas é importante. Deve ser o começo do nosso trabalho. Conceitualizar, definir, dar nome aos bois. Cortar as unhas de vez em quando é bom. São estudantes, pais de reféns, tenentes-coronéis. São pessoas comuns, são assassinos cruéis. São bons e maus invertendo os papéis. São rimas malucas, pinéis. São mistérios da meia-noite, que voam longe, bem longe…
Será que a poesia encanta e acalma a alma? Será que ler e fazer arte abranda o sofrimento e sublima a agressividade? Pintar, esculpir, cantar, dançar, fotografar, tecer, desenhar e redesenhar… São tantas as perguntas e tão poucas as respostas satisfatórias… Na verdade, cada nova resposta traz mais perguntas do que a satisfação da resposta alcançada. O ponto serve para afirmações. As reticências para deixar a dúvida ou a incompletude. A exclamação demonstra indignação, surpresa. A interrogação é a pergunta, a própria dúvida, o questionamento. Proponho que todos que estiverem lendo esse trecho que agora escrevo parem nesse momento, peguem um pedaço de papel, um lápis e uma borracha e escrevam uma poesia (ou pelo menos algo que considerem que seja uma poesia) e mais tarde mostrem para uma pessoa e peçam que esta lhe dê uma opinião sincera. Cuidado com a opinião de uma pessoa muito amiga! Melhor seria a opinião de uma pessoa desconhecida, mas se sua timidez não o permitir pode ser qualquer outra pessoa, até sua mãe ou filho(a). {18/06/2000 – Domingo – 20:25}
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