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A Desobediência Civil na USP (O que é a Desobediência Civil?)

A desobediência civil é um termo que fez história com Martin Luther King e Mahatama Gandhi. Ambos desobedeceram leis instituídas para a vida civil em seus respectivos países, Estados Unidos e Índia. As leis eram legais, claro, mas não eram mais éticas e morais. Não eram mais legítimas. Foi uma guerra, na verdade. Foi a anti-guerra como guerra. Pacifismo e desobediência civil se aliaram e a atuação desses dois homens, nesse percurso, foi realmente linda e um feito histórico memorável. Não há liberal e democrata que não reconheça isso.
Podemos ver a desobediência civil em vários outros episódios, alguns de menores proporções, mas não menos honrosos. E então, nasce a questão teórica: o que é desobediência civil e o que não é?
Uma característica comum da desobediência civil é que ela não precisa, para ser legítima pela maiora da população na qual ela é exercida, de nenhuma autoridade ou autorização. Ela desponta como ato legítimo e ganha a sociedade toda como rastro de pólvora. É como Rosa Parker. Ela simplesmente sentou no ônibus e lá ficou. E daí? Quem iria tirá-la? Iriam arrancá-la à força. Podiam, mas não fizeram. E quanto tempo durou tudo isso? Apenas horas.
Vejam agora como este NÃO É o caso dos estudantes da USP na invasão da reitoria. Se o governador, hoje, quiser tirar os estudantes de lá à força, ele pode perder alguns votos, mas ganhará mais outros. A população de São Paulo talvez até aplauda, dependendo do tipo de força que ele vier a usar. Serra foi Presidente da UNE e tem cacife político para usar um tipo de força branda. Ou seja, ele ainda tem legitimidade. Mais que os estudantes, se formos ver não em termos de voto, mas em termos de apoio (em termos de votos, também). Ao mesmo tempo, veja como que determinados professores – sempre os mesmos que mostram a faceta corporativistas de sempre, e que de modo algum caracteriza a esquerda – correm para dizer que apoiam a "desobediência civil". Ora, o fato deles, com o perfil ideológico que possuem, apoiarem, já mostra que não se trata de desobediência civil. Se realmente fosse, ela ganharia a maioria sem que eles viessem a apoiar ou não apoiar.
Veja, não estou aqui dizendo que a ação deve ou não continuar. Já disse que os estudantes que lá estão atiram errado, que o problema da USP não é o que eles dizem que é. Mas essa é outra questão. Estou mostrando aqui que o ato que fizeram não se caracteriza, pela história, sociologia e filosofia, como desobediência civil.
Mandela ficou quarenta anos na prisão. Havia todo tipo de manifestão a favor dele. E ele ficou lá. A desobediência civil só começou mesmo, contra a segregação na África do Sul, quando o mundo todo começou a ter manifestações contra aquilo, em atos: boicotes de todo o tipo. E isso, então, tornou-se comum no interior da África do Sul – o desrespeito à segregação. Já não dependia mais de manifesto. Era natural não concordar em participar de atos juntos com o governo da África do Sul, pois ele era segregacionista. Atletas não queriam competir. Comerciantes não queriam mais comprar e vender. A África estava isolada.E internamente, brancos já não obedeciam as regras. Não era necessário um grupo de professores que se achava de esquerda autorizar a desobediência civil.
O ato dos estudantes da USP é um ato de protesto. Isto sim. É válido. Muito válido. Errado quanto aos objetivos. Pois é a autonomia que defendem que custou para a USP o que custou, o estado em que está, de crise. Mas o ato dos estudantes não é um ato de desobediência civil, conceitualmente falando. Muito menos é uma "aula de democracia", como quer Olgária Matos.
 
Paulo Ghiraldelli Jr.
"O filósofo da cidade de São Paulo".

Paulo Ghiraldelli Jr.

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