Simplicíssimo

Loirice

Sentei em frente à máquina de escrever (sim, do tempo que não tinha computador e mimeografo era a melhor opção para as cópias). O chefe estava me cobrando o texto atrasado para fechar a edição. Então deixei os dedos trabalharem por mim: “Na verdade essa história da cor dos cabelos e o intelecto é tudo bobagem, preconceito mesmo. As coisas não são bem assim. Há até quem diga que tudo não passa de dor de cotovelo das morenas.” Fui interrompido pelo barulho do telefone (sim, do tempo em que eles faziam “trimmm” de doer o ouvido). Era uma das minhas amigas loiras, ou loira amiga, sei lá.

_ Oi Antônio, você tem o telefone do seu primo?
_ Oi Bety. Aquele que ficou com você na festa?

Não tinha com ser outro, eu só tinha um primo mesmo. Mas minha fama de sarcasta tinha lá seus fundamentos. A conversa seguiu:

_ Sim, o Tiaguinho.
_ Tenho sim. Ele vai ser papai, né?
_ O quê? Como assim?
_ Putz, você não sabia?
_ Não, ele não me disse nada. E falamos ontem mesmo.
_ Puxa, mas que furo eu dei então! Vai ver ele não queria que você soubesse…
_ E por que não iria querer?
_ Sei lá, vai ver que o filho é de vocês e…

O meu jeito de novo. Para mim, estava claro que era uma brincadeira e que eu me divertia assim. Como também era claro que ninguém entendia dessa forma. Ela pareceu assustar-se:

_ Nosso? Mas a gente usou camisinha e … bom … hãaaa … nem todas as vezes… aiiiiii! Mas ele teria me contado!
_ De repente ele quer ter um filho independente ou te contar só quando estiveres barriguda, sem poder esconder…
_ Barriguda, eu? Mas que desgraçado! Bem que eu achei que não dava pra confiar nele. Tem fama de mulherengo. Pensando bem, não vou me estressar agora. Deve ser de outra mulher.
_ Então menina, vai com calma mesmo. Quando a criança nascer você faz aquele tal teste de DNA pra saber se é teu ou não.
_ Antônio você é um anjo. Vou fazer isso mesmo. O que seria de mim sem você.
_ Imagino, Bety … digo … imagina, Bety…
_ E não quero mais o telefone dele. Obrigada mesmo!

E tão logo desligou o telefone, voltei para a máquina de escrever. Arranquei a página (fazendo aquele barulhinho bom que só quem é daquela época conhece), amassei com raiva e joguei no lixo. Precisava urgentemente outro assunto para fazer meu texto e meu chefe parar de encher o saco…

Eduardo H. Sabbi e Ibbas Filho

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