Juventude, Joseph Conrad
Juventude, o livro de Joseph Conrad, narra a história de Marlow (narrada por ele próprio, Marlow, numa taverna a quatro ouvintes), não qualquer história, mas a história que para ele mais marcou sua vida, pois foi aquela em que ele mais sentiu arder em sua alma as chamas da juventude, e o todo o sentimento desvairado de imortalidade e megalomania que a juventude, graças a Deus, nos traz.
Marlow narra como trocou um elegante navio britânico por uma banheira velha que levaria carvão a Bangladesh, o misterioso oriente, e o motivo da troca foram dois: pela chance ímpar de visualizar o oriente e por ter seu primeiro grande cargo na sua vida, segundo em comando. Com estas promessas Marlow lança-se ao mar num navio que enfrenta tempestades, começa a fazer agua (afundar), as bombas quebram, os fragalhos do navio são conduzidos a duras penas e pouco sono a um porto, fica meses parado para então seguir nova viagem e novos infortúnios.
Marlow não narra um dia feliz que seja a bordo do velho Judea, a velha banheira cheia de ratos que traz grafado em sua proa "fazer ou morrer". Incendio, agua, ratos, falta de comida e um capitão que perde a sanidade, mas em nem um único momento você encontra o velho Marlow reclamando de onde está, pode xingar os outros homens, esta ou aquela má sorte, mas nunca a sua escolha, nunca onde está, ao contrário, cada desgraça é narrada de maneira única, quase um regozijo, sempre terminando a lembrança, antes do pedido de mais vinho, com um suspiro exaltando "ah, a juventude…".
É emocionante o relato sobre algo que todos nós já sentimos alguma vez na vida, mas este capitão, e não me refiro mais a Marlow, a personagem, mas sim ao seu autor, conseguiu reter na memória para colocar em palavras no seu livro:
"…Lembro os rostos cansados, as figuras abatidas dos meus dois homens, lembro da minha juventude e de um sentimento que nunca mais haverá de voltar – o sentimento que eu poderia durar para sempre, mais do que o mar, do que a terra, do que todos os homens; o ilusório sentimento que nos atrai para alegrias, para perigos, para o amor, para o vão esforço – para a morte; a triunfante convicção de força, o calor da vida numa mão cheia de pó, a chama do coração que todo ano diminui, esfria, arrefece e expira – expira muito depressa, depressa demais, antes da própria vida.".
Juventude é um texto intenso, sem floreios gramaticais, com uma riquesa sobre o mar que só quem já o viveu para poder relatar, e é sobre tudo, um texto sobre o homem, nossos vícios e virtudes, mas sem o compromisso com uma lição de moral, as coisas acontecem e deixam de acontecer por puro acaso, mera casualidade, assim como nós tocamos nossa vida. Ou somos tocados.
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