Simplicíssimo

Da Barriga Vazia ao Farto Escárnio

E tem aquela história que ninguém sabe se é conto popular, lenda, folclore, verdade verdadeira mesmo, ou invenção de um escritor maluco.

 

         Robértson nasceu no cruzamento do nada com a miséria quase absoluta. Era mais um, o primeiro dos seis irmãos, da família que labutava na fazenda do coronel a troco de quase nada. Aos seis anos já acompanhava os pais ao canavial, ajudando a cortar cana ou simplesmente segurando no colo um dos irmãos barrigudinhos.
         Do pouco que sabia, desde muito miúdo, era que aquilo não era vida pra ele. Na verdade pra ninguém, mas confidenciava à mãe, desde tenra idade, que assim que pudesse iria pra cidade, buscar uma vida melhor.
         Aos treze se foi, aproveitando uma bebedeira do pai e o consentimento choroso da mãe. Foi-se como veio, despercebido pela maioria, desaparecendo na rabeira do caminhão rumo ao desconhecido.
         Dois anos sem notícias, a família continuava um pouco mais pobre, se isso fosse possível, porque Deus queria. E Ele mesmo quis que um dos capangas da fazenda trouxesse o telegrama de Robértson à mãe, lido pelo próprio entregador, por motivos óbvios, explicando que abrira uma conta corrente e depositara um dinheiro que poderia ser sacado na agência lotérica. Melhor que isso, que todos os meses mandaria, no mesmo dia, quantia suficiente para que os irmãos e a mãe não precisassem trabalhar. Recomendou matricular os pequenos na escola mais próxima.
         E o tempo continuou passando, dois, três, cinco, sete anos, dez, doze. Nesse tempo os depósitos foram se tornando maiores, dando condições da família primeiramente alugar uma casa na cidade mais próxima, depois compra-la. Os irmãos estavam na escola, não faltava comida, roupas, e até sobrava para algumas farturas.
         Desde cedo os pais falavam aos quatro ventos sobre a sorte do primogênito e sua dedicação à família. Contavam que virou doutor, mesmo nunca mais o vendo, nem tendo dele estas informações. Ficou famoso nas redondezas o bom filho Robértson.
         Novo telegrama, trazido e lido pelo irmão que mais cedo aprendera a ler. Novidades. “Mãinha, as saudades apertaram de vez. Depois de catorze anos de trabalho duro em São Paulo, aviso que volto pra ficar. Chego mês que vem. Saudades. Seu filho Robértson.”
         É claro que a notícia se espalhou aos quatro ventos rapidamente. Só se falava nisso. Nas ruas, as suposições de como chegaria o Dr. Robértson, viagens imaginativas do repertório popular. Evidente que notícia de tal volume para um vilarejo perdido no meio do nada chamaria à atenção o prefeito, o delegado, até o coronel, ex-patrão da família privilegiada.
         Na data marcada, até o fotógrafo e a repórter do único jornaleco existente lá estavam, junto ao povo, aglomerado na praça principal, à espera do retorno do filho pródigo.
         O sol castigava, e lá ao fundo via-se a poeira levantada pelo possante conversível vermelho aproximando-se lentamente. Uma volta pela praça em meio à população em completo silêncio. Desce do carro uma loura estonteante, praticamente seios e bundas apenas, dirigi-se à mãe paralisada e a beija…
         Demorou menos de duas semanas para que a normalidade voltasse. Pouca novidade na cidade. Robértson, ou simplesmente Bete Love, era o proprietário da primeira casa de diversão masculina da cidade, a Night Star. Fez sucesso a moça, e tem como clientes preferenciais o prefeito, o delegado e o coronel…

 

 

 

 

Marcos Claudino

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