São Paulo, 29 de janeiro de 2008.
Século XXI, plena era digital, recursos tecnológicos avançados, prontos a serem ultrapassados no próximo minuto. Pois numa residência situada a míseros metros da fronteira dos municípios de São Paulo e Cotia, a televisão não mostra imagens minimamente definidas sem a instalação de aparatos cujos recursos financeiros da família ainda não permitem a aquisição. Dessa feita, restam os DVDs. Um a um, e em boa quantidade, originais, paralelos, copiados ou apreendidos na operação realizada pelo primo policial, foram sendo vistos e revistos. E ao final de pouco mais de dois meses já estavam esgotados.
Lá estava ele, esperando o uso. “Orgulho e Preconceito” olhava-me de soslaio, maroto, rindo-se por saber que logo seria assistido. Mas eu resistia. Já ouvira falar do livro, um sucesso da cultura estadunidense, fato esse gerador de minha resistência. Até que certa tarde sem graça e sem dinheiro pra sair, a esposa sugere, e o marido durão admite que, mesmo com a opção das sombras e chuviscos do Faustão ou do Gugu, é mesmo a melhor opção.
Pipoca estourada, as derradeiras latinhas de skol nas mãos, edredom a postos, é engolida pelo moderno DVD, presente dos bondosos padrinhos, a famigerada mídia digital. Tudo muito interessante, ambiente, cenário, atores (O Donald Sutteerland é ótimo), o casal protagonista do drama é lindo, as maldades, os preconceitos e orgulhos desfilam às tonalidades coerentes que a época e circunstâncias determinam. O final água com açúcar e o beijo que não vem decepcionam os dois espectadores, cada um por um dos respectivos motivos.
Ponho-me a pensar, pego o violão mas não consigo concentrar-me. Um dos personagens intriga-me. Pois não bastava que um dos mais repugnantes ícones da trama, um avarento, preconceituoso, materialista, pulha improdutivo que conta com o apoio financeiro de uma infeliz marquesa ou duquesa da região, não bastava que ele tivesse todas as características citadas e outras que não consegui detectar num primeiro momento, fosse, também, vejam vocês, baixinho. Não um baixinho qualquer, mas um baixinho com a barba sempre mal feita, as roupas ensebadas, ou seja, a representação do que o diretor interpretou que esse sujeito pudesse levar para ganhar um pouco mais, se fosse possível, de nossa antipatia. Não é preciso descrever com muitos detalhes que nosso mini-pulha ficasse, ao lado da alta e esbelta protagonista donzela, numa desproporção de altura desconcertante, forçando aos risos dos espectadores no pedido de casamento não aceito.
Sei que o papo está chato, mas termino-o rápido, prometo. Pois para uma obra que tem a pretensão de esclarecer sobre o assunto, representa-o de uma forma, como diria, bastante preconceituosa. Os padrões estéticos adotados pela direção do filme também são preconceituosos e, numa eventual pretensão de alertar o espectador sobre o tema, cria-o pelos conceitos estéticos utilizados. Ou seja, não adiantou, ao menos para alguns baixinhos esquisitos como este que escreve essas sempre tortas linhas.
Marcos Claudino, 38 anos, casado, profissional de Recursos Humanos, baixinho, não vai ao BBB, nunca, mas tem cada dia mais a certeza de que é mesmo um caso perdido, que não consegue mais assistir nada sem emitir uma visão paralela sobre a mais besta das coisas…
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