São Paulo, 13 de agosto de 2009.
Descemos das árvores, mas não foi fácil tomar coragem e nos organizar para isso. O certo é que começamos a recolher aquelas sementes do chão para nosso sustento.
Um dos nossos, talvez o primeiro empreendedor, encontrou uma maneira de recolher, com a ajuda de um ou dois assistentes (os primeiros empregados), as sementes que sobravam sem aproveitamento. Recolheu, armazenou e, mais tarde, ofereceu aos semelhantes no conforto de suas cavernas geladas, claro, por uma módica quantia de algum produto que ele não possuía.
Tudo ia bem, até que o filho deste empreendedor, ao assumir o lugar do pai falecido (morto pelo primeiro seqüestrador), percebeu que era necessário inventar um papel no valor de certa quantidade de sementes.
Pronto, apertaram o botão do foda-se. Inventaram o dinheiro. Não bastasse terem inventado o trabalho (escravo ou assalariado), agora tínhamos o lastro.
Mas pior foi o neto do primeiro empreendedor. Este inventou a venda à prazo. O comércio de sementes, agora dividido em segmentos relativamente organizados, já distribuindo seus produtos nas mais longínquas tribos, agora trabalhava com perspectivas de ganhos futuros (administrados pelo primeiro presidente da bolsa).
Claro que outros empreendedores já haviam aparecido nestes paralelos de tempos, e a rede de distribuidores já contava com produtos artesanais, comércio de serviços, transportes, pecuária e as primeiras manufaturas.
O problema é que o bisneto do primeiro empreendedor tomou um calote e, conseqüentemente, não pagou uma enorme rede de empreendedores (já citados acima). Resultado: teve sua empresa saqueada e sua família barbarizada e dizimada pelo primeiro revolucionário e seus seguidores.
Pronto, não se confiava mais em ninguém, e o jeito foi aparecer o primeiro burocrata. Tinha até boas intenções o rapaz, mas foi mal interpretado. Ele só queria botar um pouco de ordem, e acabou por desorganizar tudo. Acabou, é lógico, assassinado pelo neto do primeiro revolucionário e os netos de seus seguidores.
Daí até criarem as primeiras leis, os primeiros formulários, os primeiros chefes de gabinete, os primeiros presidentes de senados, e os primeiros atos secretos, foi um pulinho.
E o resultado de toda a boa intenção do primeiro burocrata em restabelecer a confiança entre os seres humanos foi engolido pelo sistema, já pulsante sem sequer a necessidade de uma sociedade dita organizada.
Hoje não se fala mais em confiança, com a exceção de instituições religiosas que convencem os descendentes dos primeiros fiéis a entregar tudo o que têm em troca de um certificado assinado pelo Senhor Jesus Cristo.
Fim, mas poderá vir mais…
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Marcos Claudino, 40 anos, profissional de Recursos Humanos, esperando o certificado, fumando na calçada da frente, tomando meio copo de chope antes de subir na moto e voltar pra casa, o único lugar que pode confiar nas pessoas.
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