I
– O senhor vai me desculpar, mas sem o carimbo do Teixeira não tem jeito.
– E o Teixeira não está?
– Não.
– E o carimbo dele?
– O senhor me respeite. Olha o desacato ao servidor…
– Vai me dizer que o Teixeira leva o carimbo quando sai da repartição? Olha só, tem um carrossel lotado de carimbos aí do seu lado. Será que o do Teixeira não está aí, não?…
– Bom, enquanto isso vamos vendo os outros documentos. Trouxe o DIRC atualizado da Paresp?
– DIRC da Paresp… DIRC da Paresp… Tá na mão. E quitado antes do vencimento.
– Só que tem uma coisa… esse adendo da minuta ainda não foi averbado na Junta.
– Não entendi.
– O Benê do guichê 11 vai explicar direitinho pro senhor. Mas já vou lhe adiantando que tem que voltar até o 8º Cartório e reconhecer de novo a firma do antigo proprietário. Essa aqui não vale mais. Então, é melhor fazer o seguinte: antes de ir pro guichê 11 o senhor vai até o terceiro andar e fala com a Wilma. Saindo do elevador, primeira à esquerda, primeira à direita, de novo à direita e o senhor vai dar de cara com uma salinha verde, que tem um bebedouro quebrado.
– Sei, debaixo de um calendário da Seicho-No-Iê. Estive lá na semana passada.
– Isso. É só pegar a senha e aguardar ser chamado.
II
– Eu vou lhe dar um protocolo da requisição. O senhor leva até o Denorf e solicita a emissão do Nada Consta da Delegacia Fazendária. Não demora muito, não.
III
– Bons antecedentes, ok… Certidão Negativa de Débito, ok… habite-se, registro do inventário, 2 fotos 3×4. Mas eu preciso também do requerimento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido e os últimos cinco boletos do ISSQN, comprovando o recolhimento. É que antes da homologação do prontuário, o DPTS pede o formal de partilha em duas vias. Até julho do ano passado podia fazer por procuração, só que agora o cartório está exigindo a presença da pessoa.
– Mas ele mora em Muzambinho…
IV
– Aparentemente só estão faltando o número do PIS Pasep do inventariante e uma cópia frente e verso autenticada do ITBI pra poder dar baixa. Caso contrário não é possível correr com a papelada.
– Mas quando eu vim aqui da outra vez aquele senhor de óculos ali me disse que uma segunda via da…
– Não, não. De jeito maneira. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. A petição tá certa, mas precisa constar uma ressalva prevendo o usufruto da viúva.
– E essa instrução normativa para unificação de cadastro?
– Isso aí pode levar embora porque não vai servir pra nada. O senhor me providencie um termo de responsabilidade, com assinatura de três testemunhas. É só disso que eu preciso, trazendo até segunda-feira pra mim tá bom. Agora, veja bem, isso aqui é a minha parte, entendeu? No guichê 14 vão informar ao senhor como dar entrada no pedido pra saber em qual jurisdição do CASP esse DERC deve ser encaminhado.
V
– Meu amigo, eu não estou autorizado a emitir o TCF sem a apresentação do canhoto do D.O.R. Além disso, olha só, tá faltando a rubrica do perito técnico. Outro dia mesmo apareceu um cidadão aqui com um caso parecido com o seu.
– Bom, resumindo…
– Só na Secretaria, das quinze e trinta às dezesseis e quarenta. E traga também um atestado de saúde.
– Ah, isso com certeza não precisa. Se eu não morri até agora correndo atrás disso tudo, é sinal que a minha saúde tá ótima.
Estava enganado, coitado. Cinco minutos depois, enquanto corria ofegante do guichê 7 para o 18, teve um mal súbito e morreu. O sub-escrevente adjunto adiantou-se e proclamou:
– Ninguém faz nada, ninguém toca no morto enquanto não sair o Alvará de Liberação do corpo. Mas já vou avisando que o Edmilson, que cuida disso, está de licença-prêmio e só volta daqui a seis dias.
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