Pereirinha era um daqueles caras legais, camaradas, sempre de bem com a vida. Andava de bar em bar, estava em todas as festas e eventos, esbanjava elegância mesmo dentro de casa e de pijama. Falava e convencia como poucos. Ninguém sabia de onde vinha tanta cultura, até porque muitos não entendiam uma palavra do que ele dizia ou talvez porque não era nada muito entendível mesmo. Cultura ou enrolação, tratava-se sem dúvida alguma de uma figura e tanto. E foi Osmar, seu grande amigo de infância, quem teve aquela idéia, entre um intervalo do pandeiro e uma pitada de fumo.
_ Você tem que ser político.
_ Imagina Osmar, eu fora!
_ Não, falo sério. Tem pinta de político, fala como político.
_ Nem pensar, me deixa quieto no meu canto homem.
_ Imagina só você sendo o prefeito dessa cidade. Quanta coisa você ia poder fazer hein Pereirinha? E com esse teu jeitão então, em breve seria governador e até presidente.
_ Mas … – Osmar estava embalado. Tapou-lhe a boca e seguiu falando.
_ Mas nada homem de Deus! Você iria andar por aí de limousine abanando para o povo, viver voando de avião e visitando outros países desse mundão.
Um brilho lhe saltou os olhos. Sempre quis voar de avião. Ficava horas olhando os aviões que passavam com suas luzes piscantes pelo bairro em direção ao aeroporto e se imaginando mais perto das nuvens. Assistia a todos aqueles filmes de seqüestro em aviões mas nem sabia o enredo. Queria mesmo era ver o cenário. E Osmar não parou por aí. Sabia que estava quase lá. Não era à toa que eram tão amigos.
_ Vai morar no Palácio da Alvorada … fazer cada festança na Granja do Torto … falar um monte de bobagens em tom de discurso, cagar umas leis por aí … sem falar na ajudinha que ia dar pra todo mundo aqui né Pereirinha? E aposto que você ainda não pensou na patroa sendo chamada de Primeira Dama …
Um sorriso abriu-se em seu olhar distante e iluminado. Parecia voar por entre as nuvens, mesmo que o céu não tivesse nenhuma sequer naquele momento. Não houve pausa:
_ E o povo nas ruas gritando sem parar: “Zé Pereira, Zé Pereira, Zé Pereira!”…
Aterrisou repentinamente. Algo não soara bem. Enrugou a testa e fez uma carranca de assustar até mesmo o seu grande amigo. Foi curto e grosso em suas próximas palavras:
_ Zé Pereira não Osmar, Pereirinha! Sr. Presidente P e r e i r i n h a! – e decolou seu olhar novamente para as nuvens …
A campanha política fora um sucesso. Idéia do Paulão, que topou de cara entrar de cabeça no apoio ao Pereirinha. O lema era Política Segura. Sem panfletos que era pra não sujar a rua e manter o clima politicamente correto do candidato, mesmo que ele não fosse (como geralmente aliás, acontece na vida real). Mais: tinha que ser algo útil, como ele seria se eleito (sem comentários).
Todos adoraram a idéia da camisinha. Quando chegou o caminhão com todo o material então, foi aquela alegria. Ficaram ótimas. Nas cores do partido, tinham frases de impacto variadas:
- Contra a procriação da roubalheira, dos crimes e da inflação: vote Pereireinha!
- Com Pereirinha, você vai poder gozar a vida tranqüilo!
- Pereirinha, o candidato intimamente ligado ao seu desejo e à sua necessidade!
- Meta na urna com confiança: vá de Pereirinha!
- Vote Pereirinha para não reproduza os erros dos outros!
- Agora é Pereirinha, porque voto de castidade é coisa do passado!
- Se duas cabeças pensam melhor do que uma, use bem as duas, vote Pereirinha!
Tinha até camisinha com cédula impressa direto no látex. É bem verdade que isso gerou alguma polêmica. Teve a mesária que meteu a boca no eleitor que levou junto uma Playboy com a desculpa que precisava ver a “cola” para votar certo. E o outro mesário que teve que ir lá tirar a boca dessa primeira do eleitor …
Também houve reclamações das fiscais na contagem dos votos ao se depararem com algumas cédulas que estavam um tanto grudentas. Por mera coincidência, nelas o voto sempre era para o Pereirinha.
E apesar de estupendo sucesso, Pereirinha perdeu a eleição. Mas ao contrário do que se possa pensar, ele não deixou de ser o falastrão bem-humorado e querido de todos. Ainda mais que nunca o bairro teve um controle de natalidade tão eficiente como o daquele ano.
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