Depois de um breve estudo num material sobre a aposentadoria, resolvi compartilhar algumas de minhas reflexões. Começando por pragmatismos, penso que podemos dividir a aposentadoria em duas situações, de acordo com a forma que ocorre: (1) inesperada, que ocorre de forma abrupta, por questões alheias à vontade do indivíduo; é o caso das aposentadorias por doença incapacitante, tempo de serviço ou determinação do empregador e (2) planejada, desenhada ao longo da vida ou definida pela pessoa em algum momento específico.
Não é difícil imaginarmos que a primeira está mais sujeita a uma vivência de repercussões traumáticas. Ser atacado de surpresa pelo inesperado sempre provoca e exige reação, geralmente trazendo danos diretos (como uma incapacidade física) e indiretos (como uma depressão). Entretanto, ambas possam resultar em aposentadorias frustradas e problemáticas. É o que acontece na segunda situação, por exemplo, quando uma pessoa passa a vida inteira empurrando para a aposentadoria atividades que poderia e até deveria mesclar ao longo de toda a sua vida (lazer, viagens, etc.).
Logicamente, a situação financeira da grande maioria dos brasileiros não conforta muito os expectantes de uma aposentadoria com pleno gozo do resultante lucro acumulado por anos de trabalho. Tampouco se pode esperar muito do sistema previdenciário, que em tempos modernos passou de certeza a incógnita num pestanejar. E uma das explicações da falência da previdência está na própria sistemática do pagar e receber. Quando implementada tal política financeira, a composição societária era claramente uma pirâmide de larga base composta pelas crianças e jovens e o estreito ápice pelos velhos (até o ano 2000). As mudanças chegaram, as pessoas estão controlando a natalidade e vivendo cada vez de forma mais longínqua, determinando uma remodelagem na figura geométrica, que tende fortemente à retangularização (ano 2020 e 2050) e, quem sabe, uma possível inversão futura. Assim, se antes tínhamos mais pagadores e menos beneficiários, a situação atual passa a ser equivalente e pode-se prever um aumento no rombo para as próximas décadas.
Não é de se estranhar pois, que o IBGE nos informe em 2003 a aferição de 4,6 milhões de velhos que retornaram ao mercado de trabalho, cerca de 1/3 da população idosa. Menos mal que estas pessoas possam retomar atividades. Aliás, há muito caiu por terra a preconceituosa Teoria do Desencargo, proposta por dois norte-americanos em 1961. A idéia básica era de que o aposentado, tomado pela decadência física e psíquica, deveria abster-se de toda e qualquer atividade laborativa e social. Na mesma década (1968) já era proposta a Teoria da Atividade, batendo forte na questão da manutenção de papéis como ponto fundamental para a satisfação do ser humano.
E quando se fala em atividade, inclui-se toda forma de estimulação, seja cognitivo, social, físico, emocional, etc. Não é à toa que vemos os grupos de convivência se multiplicarem saudavelmente pelas cidades com música, dança, palestras, leituras, mutirões e muito mais. Logicamente que será muito mais provável o êxito seguindo dentro de hábitos, relações e padrões que se firmaram ao longo da vida (e aqui temos a Teoria da Continuidade) do que a implementação de atividades novas e desconhecidas, que geralmente caem no desinteresse dos velhos. Há quem deseje seguir trabalhando e deve ser assim estimulado dentro das suas capacitações e habilidades. Algumas pesquisas demonstram que há maior precisão e confiança (menos faltas por exemplo) no trabalho de pessoas mais velhas que, aliados à experiência, compensariam uma certa diminuição na velocidade com que trabalham. Ah e não posso deixar escapar uma atividade que é quase exclusividade das pessoas mais velhas: ser avô e avó. Fui buscar um texto que já recomendei noutro artigo no Portal da Família e encontrei vários outros. Vale a pena dar uma passada por lá.
Por fim, mas sem esgotar o assunto, penso que a aposentadoria, e a vida como um todo, não deve estar baseada apenas num pilar (e geralmente é o financeiro ou profissional). Aposentar-se do trabalho não significa aposentar-se do convívio social, familiar, das atividades laborativas, do lazer, da vida como um todo. Ou então estaremos aceitando o absurdo preconceito da aposentadoria como sinônimo irrefutável de inutilidade e jogaremos todos os velhos para o canto mais distante e escuro que conhecemos. Seria uma injustiça sem tamanho, de deixar qualquer cidadão sem pose alguma.
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