Novembro de dois mil e cinco. Nuvens negras pairam sobre o planalto central. Notícias vem de todos os cantos informando que a chuva ácida vem subindo do sudeste e que a neve do Aconcágua derrete em velocidade indescritível.
Naquele lugar onde outrora cientistas faziam pesquisa de biodiversidade, um deserto abriga as iguanas que desceram da América Central. Cachorros selvagens, antes animais de estimação, há muito deixaram de sê-lo, desde que a comida ficou escassa para os humanos e estes utilizavam seus melhores amigos até mesmo como alimento.
Nos céus, zeppelins planavam, fazendo propaganda de uma nova ração sintética à base de minerais extraídos do solo, cada vez mais pobre sem vida, ou de uma empresa de extração de água potável das geleiras de Marte, recém privatizadas pelo governo global.
Dor não se sentia, pois o implante positrônico ao qual todos fôramos submetidos no ano anterior eliminava esta chatice. O único problema é que levava junto consigo também a sensação de prazer, ao que me lembro, parecia ser algo bom.
Dormir nestes caixotes na parede não pode ser considerado confortável, lembro da antiga casa da vovó. Mas quando penso naqueles que tem de procurar abrigo noite após noite e que ficam mutilados pela chuva ácida quando não conseguem se proteger, me conformo.
Houve um tempo, contam os mais velhos, em que existia uma coisa chamada sonho. Algo que ficava dentro da cabeça de cada um e era diferente entre as diferentes pessoas. Essa coisa, diziam, fazia a vida ter sentido. Funcionava como um guia. Hoje não precisamos mais disso. Temos todos os implantes dos quais necessitamos: de saciedade, de equivalência de sono e de eliminação da fadiga. Assim, nosso trabalho como carregadores pode ser feito por muito mais horas do que antigamente.
No outro dia, na minha folga anual de dois dias, fui à Armazenoteca Municipal, onde guardam um pouco da história de nossos antepassados. Conheci, pesquisando no computador ao qual minha subclasse tem acesso, algo que costumavam chamar de website. O nome era estranhíssimo: Simplicíssimo. Na edição que acabei lendo inteira, descobri que constumavam se reunir por lá escritores dos mais diversos pontos do país, na época em que a divisão mundial ainda era feita por estados-nação. Inclusive, fiquei sabendo de um concurso de minicontos que o tal website organizou. Fiquei curioso para saber mais, mas quando fui procurar, meu tempo havia se esgotado.
Tudo bem, volto a pesquisar novamente na minha próxima folga, pois certamente este assunto me interessou. Agora preciso voltar ao trabalho. Zap!
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