Simplicíssimo

Ao baile

–         Já acabaram de se arrumar?

O pai, já impaciente, com um cigarro na mão, esbraveja. Apoiado na maçaneta da porta, já aberta, aguarda pacientemente (ou não) os dois filhos e a esposa se aprontarem para o grande baile.

–         Já to indo, pai, só falta a sombra, o blush e o lápis…

–         Eu to fazendo a barba, um minutinho!

–         Querido, você sabe onde eu coloquei meu colar?

–         Que colar?

–         Aquele que usei no nosso casamento…

–         Do civil ou do religioso?

–         Ih, não lembro!

–         Quanto mais eu…

O pai já está no quinto cigarro. Começa a imaginar o mapa para chegar no local da recepção. Tinha que ser tão longe, imaginou. Mas qualquer sacrifício valia naquele dia.

–         Bora, bora, bora!!

–         To pronta, to pronta!

–         Descendo…

Todos descem as escadas em direção à garagem. Entram no carro apressados e o pai dá a partida.

–         Esperem, acho que esqueci alguma coisa.

–         Ta vendo? Ta vendo o que é que dá a pressa? – diz a filha, estressada.

–         O que você esqueceu? Subo, pego e aproveito pra passar um pouco mais de perfume…

–         Pra que mais? Já está parecendo um… sei lá, incenso ambulante.

–         É o segredo do sucesso, meu bem…

–         Ah, lembrei. Esqueci meus óculos!

–         Querido, você não levou na ótica?

–         Foi?

–         Foi!

–         Então você dirige!

–         Eu não vou suar e estragar minha maquiagem.

–         Quem disse que dirigir soa?

–         Soa, sim, com esse ar-condicionado quebrado!

–         De novo essa história do ar-condicionado…

–         Então eu dirijo e ta tudo certo – diz o filho mais velho, ainda penteando os cabelos.

–         Passe para cá então, rápido, vamos nos atrasar. – O pai troca de lugar com o filho e acende o sexto cigarro.

–         Pai, você vai tirar meu perfume, apaga esse negócio! – reclama a filha.

–         Deixa de frescura, menina.

–         Vamos? Dê a partida, meu filho… – tenta apaziguar a mãe.

Tenta sair de frente. Não dá, o carro do vizinho atrapalha. Procura a ré mais perfeita. Não está dando certo.

–         Esse portão é tão…

–         Pequeno!…  – gritam os demais.

Pow. Beif. O estrondo da batida no que um dia foi o portão de ferro se confunde com o mau humor do pai.

E o atraso perdurará mais uns trinta minutos.

 

Mariana Barbosa Ferraz Gominho

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