Simplicíssimo

Balde de tinta

E de todas as coisas que se faz, a mais importante de todas é a que se está fazendo no momento. Nada é tão importante como comer, quando se está com fome; nada é tão essencial quanto dormir, quando se está cansado. É preciso fazer o presente momento com tanta perfeição que, quando olharmos para trás, termos a certeza de ser ter feito o melhor possível. Muitas vezes nos dedicamos à uma obra, se gasta tempo, esmero e talento, e quando tudo parece encerrado, e tudo está como queríamos, acontece algum imprevisto e, como uma tempestade, desmoronam todos os nossos castelos num piscar de olhos. Não é culpa de ninguém, simplesmente acontece. E não é uma, nem duas vezes que isso acontece… tantas e tantas. Agora mesmo acabei de gastar a minha manhã de segunda feira pintando um cartaz de 3,5 x 1,2m, que havia ficado uma beleza. Do além, surgiu um colega que, entrando estabanado na sala, chutou, sem querer, um pote de tinta aberto que estava perto da faixa. Não preciso explicar o que aconteceu, vocês imaginam. No momento senti uma angústia imensa de pular no pescoço do rapaz e para enchê-lo de tapas, mas seu semblante apavorado não permitia. Sentiu-se tão mal e desculpou-se tantas vezes o quanto pôde. A culpa não era dele, apenas estava distraído e de maneira alguma imaginaria tal pote de tinta no seu caminho. Poderia ter-lhe dito para que olhasse por onde andava, mas quem de nós olha. Preferi ficar calada. Observando o novo tom de arte moderna da minha obra-prima. Olhei tanto que chegou a doer, mas a culpa era minha. Enquanto os rapazes faziam um remendo no borrão para consertar, eu catatônica sentada no chão. Não havia feito o meu melhor e estava me sentindo mal por isso. Era meu dever ter fechado aquele maldito pote e mantê-lo afastado do cartaz, mas… que raiva eu senti naquele momento, raiva própria. Comecei meu auto-aprendizado. Alguns que leiam este texto, (se é que alguém vai ler) podem achar um assunto banal escrever sobre um singelo borrão de tinta. Não tiro a razão de ninguém. Sofremos do mal de esperar a gota d’água para entornar o copo. Para mim, serviu como esta gota. Espero que este texto seja a gota para alguém. Façamos o nosso melhor possível.

Evelise Birck Rodrigues

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