“- Taxi, ¿está libre?
– Si, señor. ¿Adónde va Ud?
– Al Hotel Ávila. ¿Está lejos?
– No, señor. No está lejos. Está cerca.”
As perguntas e respostas são curtas, como convém aos que se iniciam no estudo de uma língua, como parece achar um autor da franquia Berlitz. Mas ainda que em tão curtas linhas, “ele” consegue o prodígio de aprisionar o nonsense. Se não, acompanhem: um indivíduo, que por todos os motivos não deve ser o motorista, pergunta antes de entrar, ¿está libre? Resposta: Si, señor. ¿Adónde va Ud? Aí, em 2 linhas, já está o desastre: motoristas, com seus táxis livres, não perguntam aos clientes aonde vão. Recebem-nos, põem-se a rodar, e se o cliente não diz aonde vai, o taxímetro grita um bem-vindo a cada quilômetro rodado. Mas este motorista Berlitz é um homem de bem, educado, que pergunta aonde vai o freguês. A ser interpretado pelo álcool e boa vontade do cliente, essa pergunta será gentil ou indelicada. Se for interpretado como gentil, o motorista apenas deseja ser útil a quem entra no seu carro. Mas se for tomado como um grosseiro, ele apenas quererá dizer que a este ou àquele lugar o seu táxi não estará livre.
Bueno, o táxi corre mais 2 linhas. Primeira – Al Hotel Ávila. ¿Está lejos? Segunda – No, señor. No está lejos. Está cerca. E aqui mais uma vez, nesta segunda, outro desastre. Vejam por favor: este livro é vendido no Brasil, e é básico, em qualquer método ou técnica, ou visão pedagógica, ensinar novos conteúdos a partir da experiência de quem aprende. E no Brasil, atenção, Berlitz!, um motorista de táxi nunca está suficientemente perto do destino ignorado pelo cliente. Entendem? Chega um estranho, que nunca pisou na cidade, e depois de entrar no táxi (perdei a esperança, ó vós que entrais), pergunta se determinado hotel é longe. Ora, por todos os defeitos da esperteza nacional, ele receberia a resposta de que o Ávila é longe, pero no mucho. Jamais, jamás que no está lejos.
No penúltimo passo, o 25, chegamos ao importantíssimo capítulo “Como ler o espanhol”. E aqui se vê e se demonstra com mais clareza a limitação, a pobreza intelectual dos manuais facilitadores de acesso a uma língua. E tão patente é que bastaria a citação, sem qualquer comentário:
“Em los periódicos verá que acostumbran ser muy breves em los titulares:
Celoso mató a su mujer – Huelguistas exigen aumento imediato – Régimen actúa contra amenazas …
La literatura española y latinoamericana es riquíssima. Aquí les presentamos um ejemplo de poesia seleccionado de Don Juan Tenório, uma obra mestra del teatro clásico español…” E transcrevem-se versos, sem uma só observação que nos esclareça esta ou aquela palavra, esta ou aquela expressão, o que seria mais do que necessário, por se tratar de um texto que não é recente. Pensando melhor, é melhor assim, pois eis o que nos ensina sobre a prosa literária: “ En cuanto a prosa Don Quijote de la Mancha está considerado como una de las grandes obras de la literatura mundial. En ella, tanto como en otras obras clásicas, encontrará el uso de vosotros y vos….”. ¿Que tal uma floresta de pontos de exclamação para tão alta expressão de asno? Será que Cervantes, nos seus personagens e nos seus diálogos desconhecia o Tu? Será que ele não deixa o vosotros e vos para o tratamento respeitoso, cerimonioso, ou irônico? Será que esta é a característica que se destaca para se ler a prosa clássica e o Don Quijote?
Bueno, pero no siempre Berlitz es malo, por supuesto. Lá no último passo, no último capítulo, se escreve a sua mais importante lição: “VOCÊ SABE MAIS ESPANHOL DO QUE IMAGINA”. Ah, se soubéssemos disto! Com muito mais gosto e proveito e luz começaríamos por
“Es, pues, de saber, que este sobredicho hidalgo, los ratos que estaba ocioso (que eran los más del año) se daba a leer libros de caballerías con tanta afición y gusto, que olvidó casi de todo punto el ejercicio de la caza, y aun la administración de su hacienda; y llegó a tanto su curiosidad y desatino en esto, que vendió muchas hanegas de tierra de sembradura, para comprar libros de caballerías en que leer; y así llevó a su casa todos cuantos pudo haber dellos; y de todos ningunos le parecían tan bien como los que compuso el famoso Feliciano de Silva: porque la claridad de su prosa, y aquellas intrincadas razones suyas, le parecían de perlas; y más cuando llegaba a leer aquellos requiebros y cartas de desafío, donde en muchas partes hallaba escrito: la razón de la sinrazón que a mi razón se hace, de tal manera mi razón enflaquece, que con razón me quejo de la vuestra fermosura, y también cuando leía: los altos cielos que de vuestra divinidad divinamente con las estrellas se fortifican, y os hacen merecedora del merecimiento que merece la vuestra grandeza.”
Como ninguém nos avisa, estaremos sempre condenados, os que principiamos a estudar espanhol, a entrar num Café e cumprimentar, Buenos días, señor. Oh, perdone, señora.
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