Simplicíssimo

Dois momentos…

Dois momentos…
Por Luiz Maia
Certo dia eu estava a fazer compras no supermercado que fica defronte onde eu moro, quando num dado momento passei a observar a conversa entre dois senhores, aparentando ter entre sessenta e oitenta anos. Os dois falavam sobre saúde, doença e hospitais. Havia um deles animado, dizia o tempo todo que um seu amigo estava ótimo depois que se submeteu a uma cirurgia do coração. O amigo comia de tudo, não fazia nenhum regime e ainda voltou a jogar bola, com seus mais de cinqüenta anos. No canto, o outro simplesmente ouvia a conversa calado. Parecia estar doente, cheio de dúvidas, como se fosse em breve se internar para se operar de alguma coisa que não pude captar. Entendi sua insegurança, cuja aparência revelava uma grande tristeza. Entendi, do mesmo modo, a força que seu amigo lhe dera no sentido de injetar-lhe fé e esperança. Precisei sair e não vi o desfecho daquela conversa.
Noutro dia, num desses sábados que não temos nada a fazer, liguei a televisão na Rede Record, no programa de calouros de Raul Gil, quando de repente entra no palco o cantor Cauby Peixoto. Senti meu peito calar quando lhe deram um banquinho para ele cantar sentado. Logo desconfiei que poderia ser o seu fatídico ocaso. Foi quando então percebi o seu rosto meio edemaciado, seu andar trôpego e sua voz falhando como nunca ouvira antes. Era a decadência em pessoa. Aquela sua aparição quase compromeu a imagem de um cantor que o Brasil aprendeu a respeitar e a admirar. Talvez a melhor voz que esse País já conheceu, naquela tarde demonstrava que é preciso saber a hora de parar.
Selecionei dois momentos distintos que expressam a dimensão do passar do tempo em nossas vidas. Instantes que marcam o declinio da humanidade e a inexorabilidade da própria vida.
Recife, 19 de outubro de 2005

Luiz Maia

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