Você já se colocou essa questão? Afinal de contas, quem é você? Qual sua origem? Seu fim? Seu ser? Enquanto membro da raça humana, o que te constitui?
Esses questionamentos, que a primeira vista parecem simples, perpassam quase dois milênios e meio de reflexão e continuam sendo grandes problemas sem respostas definitivas. Nas diversas tentativas de respondê-los, os pensadores se dividiram muito em suas conclusões, evidenciando a complexidade dessa reflexão.
E por que nós normalmente não nos perguntamos quem somos? Já temos as respostas prontas? As respostas que temos satisfazem nossas ânsias interiores? Fomos nós quem as damos ou nos apropriamos das de alguém?
Comumente se ouve que o mundo de hoje não nos dá tempo para pensar, refletir; sendo essa preocupação coisa de quem ta com a vida ganha. Desta maneira, na correria do dia a dia, vamos nos esquecendo de nosso próprio eu e vivendo em função da correria da "vida".
Assim, constatamos que quando abrimos mão de refletirmos sobre nós mesmos, sobre nossa vida, nossos objetivos, alegando não ter tempo, vamos renunciando a nós mesmos e vamos nos misturando no NÓS da impessoalidade, da massa que não possui face.
Nessa impessoalidade, já não sabemos mais os motivos de nossas ações, fazemos uma coisa porque todos fazem, pensamos junto com a massa e raramente temos opinião própria. Em nosso país, isso tem se tornado uma constante alarmante. Afinal de contas, por que acontecem tantos escândalos políticos e nós, povo pretensamente autêntico e pensante, nos calamos? Por que aceitamos tanta corrupção de braços cruzados? Falamos que o país é uma vergonha, que os políticos não prestam, que todos só querem roubar, mas o que temos feito de concreto para mudar essa situação?
Todos esses questionamentos nos levam a refletir sobre a questão do homem em nossos dias, ou seja, no contexto atual. Esse contexto que é marcado por um mundo cada vez mais globalizado e tecnológico, em que o capitalismo feroz domina, onde o mais forte cotidianamente devora o mais fraco e em que a sociedade de consumo dá o tom da vida do povo simples, que vive para dar sustento a essa estrutura de desigualdades.
Vivemos num mundo que determina o que as pessoas devem fazer, sob a ilusão de estarem fazendo aquilo de modo livre. O liberalismo nos impôs a pretensão de que somos cidadãos livres, contudo, se não uso a roupa da moda, não tomo a bebida da propaganda e não falo as gírias das novelas sou um atrasado e retrogrado.
Você já parou para pensar nos motivos de suas ações? Na razão pela qual você escolhe essa e não aquela camisa? Será realmente que você escolhe uma camisa porque gostou dela ou porque ela tem uma etiqueta que é mais "bonita" que a roupa?
O filósofo nicaraguense Alejandro Caldera já alertava: "o que o homem faz é parte daquilo que o homem é, mas também aquilo que o homem é deveria formar parte daquilo que ele faz." Uma vez que a sociedade, por vezes, determina como homem deve agir, também determina como ele deve ser. Assim, quem controla as ações humanas, acaba controlando parte do ser do homem. Uma vez que "o fazer é essencial ao ser humano e não apenas manifestação externa de seu ser, pois seu fazer é um estar sendo."
Deste modo, diz Caldera: "por isso, quando o homem é impedido de fazer o que pode ou obrigado a fazer o que não quer, pela imposição de um sistema repressivo em seus usos e em sua forma habitual de desenvolver-se, se distorce seu ser, entendido como um natural manifestar-se e se altera seu próprio processo ontológico."
Você pode estar está pensando: "não estou sob um regime repressivo". Mas, será que o consumismo, a ditadura da moda, do carro do ano, da roupa de marca, não são um modo disfarçado de um regime repressivo? "Hoje mais do que nunca, talvez, a estrutura sócio-econômica e o sistema de vida se apresente como objetividade morta que aprisiona o homem e aliena o ser."
Não quero propor com essa reflexão que viremos às costas para nossa sociedade, nem às roupas de marca, muito menos façamos uma revolução social. Contudo, proponho para você, como proponho primeiramente para mim, uma revolução interna! Esta revolução interna consiste em pensar a parti de si, não de modo egoísta ou egocêntrico, mas de modo a refletir: por que eu faço isso? Por que eu tomo esse caminho e não aquele outro? Por que passo a minha vida inteira querendo acumular dinheiro e bens? Por que esqueço de dizer as pessoas de quem gosto que as amo?
Cada vez é mais constante em nossa sociedade o divórcio, a traição. Não pense que isso acontece porque o amor entre o casal sumiu de repente. Na verdade, na maioria de nossas famílias, nos preocupamos tanto com as questões financeiras, que esquecemos de cultivar a chama do amor, e lentamente ela vai diminuindo e, infelizmente, quando se percebe isso costuma ser tarde.
Por isso, lhe dou uma dica: pense! Serei ousado, te darei outra dica: Ame!
Cf. CALDERA, Alejandro Serrano. FILOSOFIA E CRISE: pela filosofia latino-americana. Petrópolis: Vozes, 1984.
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