Simplicíssimo

A um Mestre com Carinho

Comecei a apaixonar-me pelos livros relativamente tarde: aos dez anos de idade. Mas se engana quem pensa que minha iniciação deu-se com os tradicionais “O Pequeno Príncipe” ou “As Mil e uma Noites” – sim, aos onze li os mesmos graças aos presentes de uma tia, professora; mas os primeiros livros foram de uma característica bem diferente. Foram livros de western (aqueles “pulp fictions” mais conhecidos como livros de bang-bang) e os chamados livros de cordel – poemas satíricos a um governo ou casos de uma região -, esses últimos vendidos em feiras do interior. Meu pai, marinheiro, costumava levar-me em suas viagens de barco pelo Rio Negro e o Rio Solimões, que, em regra, duravam sete ou oito dias. Imaginem: uma semana vendo somente água e mata por todos os lados, com paradas apenas breves em cidades, para abastecer o barco (na Amazônia chamado “motor”) com mercadorias. Claro que, considerando a duração da viagem, nada mais justo que meu pai se distraísse com as leituras, embalando-se em sua rede (um tipo de leito comumente usado nas embarcações da região). E eu, deitado na rede ao lado, ia recolhendo as sobras daquelas leituras – lógico, quando me cansava do “Tio Patinhas”.
Meu pai, percebendo o gosto do filho pela leitura, certa vez sacrificou um pouco da renda mensal, para trazer-me de presente um livro que, para ele, parecia literatura infantil. Foi assim que, aos onze anos de idade, li, pela primeira vez, “O Cortiço”, de Aluísio de Azevedo. E pronto. Foi amor à primeira vista. Começava ali o romance com a Literatura Brasileira que continuaria até os dias de hoje…
Com o passar dos anos, fui apresentado a outros mestres tais como Hemingway, Machado de Assis, García Márquez – mais recentemente ao genial Juni’chirō Tanizaki -; com os quais aprendi a apurar o gosto pela leitura e a escrita. Porém, prefiro dizer que o maior mestre de todos foi um homem simples, sem formação acadêmica; um marinheiro que me deixava os livros de bang-bang para ler e suportar os dias longos de viagem pelo Rio Amazonas.
Edwal Bertoldo da Silva. Meu pai. Obrigado.

Edweine Loureiro

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