Simplicíssimo

Tráfico

    – Vô, acorda! A polícia mandou parar o barco!…
No convés, um verdadeiro alvoroço: tartarugas atiradas ao porão; duas araras trancafiadas no banheiro… E o macaco sagüi fora parar no freezer…
   Meu avô, levantando-se, pôs uma camisa e saiu às pressas do camarote para falar com o representante da Polícia Ambiental.
   – O senhor é o proprietário desta embarcação? – perguntou-lhe o policial, cujos óculos escuros refletiam a metralhadora nas mãos do soldado que o acompanhava.
   – Não, senhor – replicou-lhe meu avô. – Mas quando ele não está quem responde sou eu.
   – E quem é o senhor? – insistiu a autoridade ambiental.
   – Sou o comandante de bordo. Mas, afinal, o que vocês querem? Por que mandaram parar o barco?
   Sem dar maiores explicações, o policial fez um sinal ao soldado para que revistasse a embarcação. Foi quando meu avô interpôs-se em seu caminho:
   – Desculpe, mas o senhor não vai revistar este barco sem um mandado…
   O policial, retirando os óculos, olhou fixamente para aquele homem franzino que, corajosamente, tentava-o impedir:
   – Meu senhor, sabemos que este barco transporta animais contrabandeados… – e elevando o tom da voz: – Não faça as coisas mais difíceis, ou serei obrigado a prendê-lo por tentar obstruir o trabalho das autoridades…
   – O senhor não vai revistar este barco… – repetiu o comandante, mais uma vez interpondo-se na passagem do oficial do meio ambiente.
   Nesse momento, minhas pernas tremeram. Senti a fúria no olhar do policial e temi pelo desfecho daquela situação. Mas ele, recolocando os óculos escuros, sorriu para meu avô e disse:
   – Está bem, meu capitão: vamos conversar…
   E foram conversar a sós, na cozinha. Minutos depois, voltava o policial, um sorriso irônico, gritando para o soldado que o esperava:
   – Vamos embora!…
   Quando a lancha da Polícia Ambiental partiu, fui até a cozinha para falar com meu avô; saber o que tinha acontecido. Encontrei-o cabisbaixo. Pensativo…
   Naquela mesma tarde, o velho navegante mandou reunir tripulação e passageiros, para avisá-los:
   – Desta vez, conseguimos nos safar. Mas, na próxima beira, vamos soltar todos os animais; devolvendo à natureza o que a ela pertence! Agora: se depois disso eu descobrir que alguém neste barco ainda transporta animal em cativeiro; largo o sujeito na primeira ilhota que encontrarmos, sem bagagem, sem nada… Somente com a roupa do corpo! Fui claro?
   Todos permaneceram em silêncio, mas não havia dúvidas de que a mensagem fora compreendida. E o barco seguiu viagem.
   No freezer, porém, o pequeno sagüi não mais veria o próximo porto…
        

Edweine Loureiro

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