Dá para contar nos dedos de uma mão os casos de pedintes autônomos que conseguem fazer da mendicância uma atividade honrada e rentável. Computadas as despesas operacionais, quando muito o negócio se paga, o que emparelha nosso segmento com a pesca ou a agricultura de subsistência, por exemplo. Nunca estivemos tão longe de posicioná-lo como um foco de empreendedorismo e de atração de investidores.
Em meio a tantas dificuldades inerentes ao ofício, destacamos a chamada "mendicância sustentável" – que pressupõe um mínimo impacto ao meio ambiente e a utilização mais racional possível dos recursos disponíveis, o que resulta em ganho de imagem institucional, legitimidade da nossa função perante a opinião pública e maior valor agregado a cada real obtido nas esquinas e semáforos.
Alguns expedientes práticos são plenamente aplicáveis, de imediato, aos grandes grupos mendicantes da iniciativa privada, de controle nacional e multinacional, bem como às cooperativas de mendigos espalhadas por todo o território brasileiro – ressaltando que estas últimas vêm experimentando um crescimento da ordem de 14% ao ano nas últimas décadas, em termos de receita bruta tributável. Dentre as principais providências, podemos elencar:
– A utilização intensiva, especialmente nos estados do Acre e do Rio Grande do Sul, do papelão – material por natureza reciclável – em substituição aos trapos e colchonetes de espuma, que precariamente servem como cama e mesa de trabalho para os profissionais da esmola;
– Implantação, nos grandes centros urbanos, de postos de troca de canecas plásticas não recicláveis para recolhimento de moedas por similares de alumínio – que apresentam maior durabilidade e possibilitam descarte ecologicamente correto.
– Demarcação de pontos de mendicância determinados pelas prefeituras e outorga do selo "Mendigo Digno" aos pedintes que atuarem em conformidade com as leis municipais.
A soma destes esforços vem colaborando para que tenhamos o respeito e a admiração da coletividade. Contudo, apesar de pedintes, não queremos pedir nada. Temos a nossa consciência de classe, poder de mobilização e a certeza de que juntos conquistaremos nossas justas aspirações pelos próprios méritos. Não aceitamos o assistencialismo dos governantes nem conchavos de qualquer espécie que façam calar a nossa voz. A sociedade como um todo reconhece a função social do mendigo, um bem necessário ao equilíbrio da urbe e aos esforços de contenção da violência. Afinal, quem mendiga não assalta, não mata e não compactua com o crime organizado. Ao contrário: o bom mendigo movimenta a economia com seu rendimento diário, gerando e mantendo empregos no microcosmo em que pede esmola.
A regulamentação da atividade e sua definitiva inserção na economia formal depende fundamentalmente de vontade política, e nesse sentido a bancada mendiga no Congresso vem se mobilizando fortemente, inclusive com a constituição do primeiro sindicato da categoria associado à CUT.
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Marcelo Pirajá Sguassábia é redator publicitário e colunista em diversas publicações impressas e eletrônicas.
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