para Eduardo Sabbi*
– Alô, Júlia? Tudo bem?
– Carla? E ai, menina? Está tudo bem sim, e contigo? Que saudade…Quando tu chegaste? Como foi a viagem?
– Tudo bem… Cheguei agora, assim que entrei em casa vim logo te ligar. Ah… A viagem foi boa, o vôo é que foi um tanto turbulento. Tava doida pra te contar… Tenho UMA daquelas…
– Opa…Tem novidades? Das boas? Então conta logo. O que tá esperando?
– Sabe quem estava no mesmo vôo? O Sérgio… lembra do Sérgio?
– Sérgio… Sérgio…. hããã…. nãooooo… O Sérgio? Aquele bonitão diretor do RH? Aquele pra quem você vivia dando mole?
– Esse… esse mesmo queridinha… e ó, bonitão e gostosão… ótimo em recursos humanos, por isso o RH da empresa funciona que é uma beleza. Imagina, menina, tava na primeira poltrona, na fila ao lado da minha. Ele nem tinha me visto ainda, como sempre, mas eu, decidida a por um ponto final naquela questão, resolvi levantar e falar com ele. Estava linda mesmo e cheia de confiança. Por sorte, levantei bem na hora em que o avião deu uma baita sacudida, estava atravessando uma área de turbulência e, antes que eu abrisse a boca, me desequilibrei e só não cai, estatelada no chão, porque, sem querer, fui parar bem no colo do dito cujo…
– Foi sem querer mesmo ou foi sem querer querendo?
– Ah… assim meio querendo querendo… mas, tu me conheces… não sou oportunista não, apenas aproveitei a ocasião e a chance que o chacoalhão aéreo me proporcionou, sabe como é, né Júlia… vôos turbulentos têm dessas coisas…
– Sei, ainda mais estando Carlinha, “a avoada”, na parada mas, voltando ao que interessa… Conta o resto da história… estou pra lá de curiosa.. O Sérgio é mesmo um gato…
– Não zoa Júlia, nunca gostei muito de viajar de avião… hoje em dia então… jurei que íamos cair… De qualquer forma, Carlinha, “a avoada” é só fachada, só entre nós, amigas de infância …. Agora eu sou Carlinha, a pegadora, expert em sedução e manipulação… Huuum… de sujeitos interessantes, porém insensíveis, não dispostos a relacionamentos confiáveis, estáveis e duradouros. Deixa eu continuar… Percebendo o meu medo, ele me agarrou pela cintura e ficou ali, juntinho comigo… eu havia calculado com precisão a situação e a reação, aí, pedi desculpas, levantei rapidamente e corri para o banheiro… Pensei que fosse esperar e ficar na mão, ou… puta vibração… no auge da excitação, bateria descarregada… abri a bolsa e o pior, lá estava, eu e minha cabeça….. uma pilha… uma pilha… mas, não demorou e…
– Quer dizer… Nãoooo… quer dizer então, que o cara finalmente te deu bola…
– Custou a entender, hein, amiga… Bola?…. Bota bola nisso…. me deu bola, taco e uma tremenda canseira…
– Canseira? Como assim…? Não era o que você queria…
– O cara agora não sai mais do meu pé… diz que está apaixonado…. tudo por causa de uma sentadinha no colo e uma ajudinha no banheiro. Realmente esses ‘carinhas” não entendem a diferença entre amor e sexo… Pensam que é só eles que adoram uma “rapidinha”… Espera um instante… o celular tá tocando…. Ai, Júlia era o Sérgio… pela décima vez. Tá me ligando desde que deixamos o aeroporto.. Apesar do transtorno dessa “paixão arrebatadora e inesperada” vou mantê-lo na “fita” guardadinho na agenda…. afinal ele é educado, bonito e gostoso, um enorme consolo, e em caso de extrema necessidade na hora H, uma ajudinha vai bem… melhor que ficar na mão… preocupada… ou com a bateria descarregada. E as pilhas? Sempre me esqueço das pilhas…
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*Em resposta ao conto “O Võo", de Eduardo H. Sabbi e Ibbas Filho,
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