Simplicíssimo

Juvêncio Flores – Almerinda, a sábia

Conto abaixo mais um dos causos do grande Seu Juvêncio. Sua esposa Almerinda, privada da vida aos 50 anos de idade, deixou um marido solitário e sábio no mundo. Ele passa seu tempo pitando um palheiro e sentado num toco, para descansar da vida de pequeno agricultor e pecuarista. Muito do que ele sabe, aprendeu com ela.

Já trabalhou muito e as mãos calejadas e retorcidas pelo repuxo da enxada, da pá e do arado comprovam. Hoje não tem mais tamanha necessidade. Suas plantações são para subsistência e tratamento dos animais que rondam sua casa, como porcos, patos, marrecos, galinhas e os bezerros guaxos. Sua economia baseia-se nas consultas sentimentais que realiza, nos conselhos que, contrariando o ditado, vende. Por vezes, ao voltar da lida de campo, encontra algum visitante desconhecido o esperando. É nessas horas que percebe a importância que suas intervenções têm na vida de muitas pessoas.

Pois outro dia desses um casal chegou até sua presença e foi recebido com a dedicação de sempre. Ao relatarem seus problemas ele fez uma pausa, atirou um pouco de fumaça do palheiro no ar e falou:
– Fui casado uns 30 anos com a Almerinda, que Deus a tenha. Pois nesse tempo todo eu também quis mudar, me aventurar, enfrentar novos desafios. Um dia cheguei do campo e ela estava na porta com o mate pronto, me esperando.
– Tá e o que isso tem a ver? Perguntou seu ouvinte, já meio impaciente.
– Calma vivente, que vou contando entre uma pitada e outra.

E soltou mais uma baforada longa de fumaça para aumentar o nervosismo da dupla que o espreitava já meio de canto de olho, como ele mesmo me contara posteriormente.
– Pois então, ela estava com o mate pronto, bonito. A cuia enfeitada e topetuda com aquela erva bem verdinha! Desencilhei o pingo e fui até ela para tomar um mate que a garganta tava seca. Ela tomou o primeiro enquanto eu vinha do galpão e me serviu logo que cheguei à porta.

Nesse entremeio mais uma baforada de fumaça… Silêncio total e ele continuou.
– Pois ao tomar um primeiro gole de um mate bem frouxo, diferente do costumeiro, entrou um meio litro de água fervendo goela abaixo. Queimando tudo. Fiquei uma semana falando que nem fanho.

Enquanto botava o pedaço de palheiro na boca, falou por entre os dentes para seus ouvintes:
– É isso meus amigos. Podem ir que já lhes disse tudo que precisavam saber.

 

Mauro Rodrigues

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