Simplicíssimo

Por Correspondência – parte 2

Amores vêm e vão. Alguns marcam, outros dilaceram a alma. Assim ele se sentiu ao chegar naquele reino controverso, mesclado de beleza e violência, onde o tempo parecia parar a cada momento que imaginava encontrá-la.

Os contatos foram adiados para que pudesse primeiro entender o que se passava no lugar, onde poderia ser o melhor ambiente para o ansioso encontro. O atraso não o impediu de sonhar, fechar os olhos e divagar nas difusas imagens que se reproduziam em sua mente. Encheu-se de coragem e improvisação. Mandou-lhe uma mensagem e aguardou a resposta. Enquanto aguardava foi efetuando os preparativos. Apontando cada detalhe que poderia ser crucial para o sucesso de sua empreitada. Por fim, já impaciente, tratou de enviar novos mensageiros em seu encalço. Aguardava e não agüentava mais tanto suspense para retornar-lhe uma simples mensagem. Por certo seria feito da melhor forma possível, pessoalmente. Seu olhar brilhou entremeio às belas artes que vislumbrava, enquanto o deleite do otimismo encarregava-se de encher-lhe o âmago de esperança.

Horas passadas sem perceber. A noite já se encaminhava a dominar o reino. Não havia definido onde enfrentaria o breu. De certo uma taberna seria a melhor escolha. Não teria problemas em ser encontrado, ou esquecer os encontros que poderiam vir a não acontecer. Afogar sua sede numa boa e gelada cerveja era tudo que precisaria naquele momento. A bebida já fizera efeito, passara da alegria a valentia e agora vivia a mágoa, o arrependimento e a tristeza que culminam após outros estados de espírito mais eufóricos. Seus mensageiros não retornaram, ela não aparecera. Definitivamente, esta seria uma longa noite.

Ao ser carregado para fora da taverna que fechava, foi bravateando a tudo e a todos. Um dos carregadores irritou-se com o forasteiro e indicou-lhe uma pousada bem em frente. Colocou-o em rota de colisão com a porta e empurrou-o até seu destino. Escutou, um instante depois, o estrondo da pedra – nem mais nem menos que isso havia se tornado – na porta da pousada. Já acostumado com esses eventos, o porteiro veio até à soleira e levou-o até um quarto para que pudesse descansar. Não tinha muita estrutura – o quarto – mas permitiria que descansasse e recobrasse as forças para o dia seguinte.

Ah!, o dia seguinte! Quisera que o dia anterior não tivesse acontecido ou que ao menos não tivesse sido tão duro consigo mesmo. Todo corpo dói, a carne dilacerada, maltratada por dentro, desnutrida em seu principal combustível. Água! Água! Era isso que pensava e precisava. Por mais que bebesse, e estava cheio desta, não sentia sua sede saciar. Talvez fosse pela queimação no estômago que não o deixava em paz, talvez fosse a curiosidade em questionar os mensageiros acerca das mensagens enviadas no dia anterior. Foi em busca de explicações. As festividades poderiam esperar, corria em seu sangue um fervor que deveria ser apaziguado ou incineraria sua carne de ódio e rancor.

Para sua surpresa, ao colocar-se ao alcance dos mensageiros, estes traziam várias mensagens que se complementavam e haviam sido cuidadosamente planejadas para que ele as lesse e buscasse nelas todas as informações que necessitava. Recostou-se em seu cavalo, que havia alugado, e buscou nas entrelinhas as explicações para os eventos que não se desencadearam da forma esperada, ao menos por ele.

O texto era elaborado, planejado como já dissera. Cada palavra cuidadosamente encaixada para que não o atordoasse, amedrontasse ou irritasse. Passou pelas várias mensagens e resumiu todas a um breve suspiro seguido do comentário: "Ela não estava preparada. Temia pelo que pudesse me acontecer se a visse nesse momento tão delicado da sua vida, padecendo do mal que lhe aflige". Dito isso, resignou-se. Partiu imediatamente de volta a seu reino. No caminho já ia traçando novas cartas e mensagens a lhe enviar. Seu instinto não ficou ferido, seu ímpeto sim. Haveria de ser mais cuidadoso na próxima vez. Traduziria sua vontade num convite da outra parte ou numa aceitação que ainda não obtivera explicitamente.

Continua…

Mauro Rodrigues

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