– Minha Nossa Senhora dos esquálidos, o senhor está que é só pele e osso! O que aconteceu? A ideia era perder 15 quilos em dois meses, e em três semanas o senhor perdeu 42!
– Bom, eu simplesmente fiz o que o doutor mandou: dieta e exercício. Cortei gordura, açúcar, massa, refrigerante. Cortei de vez. Só salada, frutas e arroz integral. Deu certo, né? Não vai me dar os parabéns, doutor?
– Eu vou é lhe dar um puxão de orelha daqueles, mas o merecido mesmo era colocar em você uma camisa de força, chamar uma ambulância e interná-lo no hospício mais próximo!!
– Não estou entendendo…
– Veja você como são as coisas. Eu costumo recomendar aos meus pacientes pelo menos 140 minutos diários de bicicleta ergométrica, com carga média de esforço e respeitando a frequência cardíaca máxima.
– Sim, exatamente como eu tenho feito.
– Acontece que, até hoje, só você foi o louco que resolveu seguir isso à risca. Quando você comprou a ergométrica veio junto um livreto com a relação de assistências técnicas autorizadas, não veio? Se você procurar por elas, vai ver que nem existem, porque ninguém usa uma bicicleta dessas a ponto de precisar de oficina. São quinze dias de pedaladas na carga mais levinha e pronto, o sujeito encosta e vira cabide de roupa. Quem pode precisar da assistência técnica é o cara que vai comprar a bicicleta de segunda mão. Só que aí já acabou o prazo de garantia, embora o produto esteja como saiu da loja. Nem o plástico do selim é retirado, pode reparar. Isso acontece com 100% dos pacientes, no mundo inteiro. Há estudos científicos que comprovam o que estou falando!
– Espera aí, explica melhor essa história. O doutor está se contradizendo. Eu obedeci exatamente às orientações médicas e levo bronca por ter feito a lição de casa?
– Então, mas quando é que eu ia imaginar que alguém um dia ia seguir esse suplício a ferro e fogo? Eu recomendo por desencargo de consciência, meu amigo, já sabendo de antemão que serei desobedecido. A lógica é a seguinte: quando eu prescrevo no mínimo 140 minutos de pedaladas, é porque eu sei que o sujeito vai fazer no máximo 5. Então eu coloco essa margem a mais de 135 minutos para que pelo menos 5 sejam feitos. Compreendeu agora?
– Sim, mas…
– O mesmo ocorre com a orientação alimentar que lhe passei. Fala sério: como é que pode um ser humano passar só à base de verdura, fruta e arroz integral? Nem na Índia, meu caro. Nem faquir de circo consegue isso. Eu lhe indiquei esse cardápio pra que o senhor cortasse quando muito a picanha e a garapa, mas continuasse comendo queijo, fritura, bolo de chocolate, essas coisas que ninguém resiste. Nem eu.
– Eu juro que posso explicar. Na verdade…
– E não me venha com desculpa esfarrapada. Estou solicitando nessa guia aqui uma série de exames, para a gente investigar direitinho o estrago que o senhor fez com o seu organismo. Desculpe eu ficar assim, meio exaltado, mas tudo tem limite. Ora, onde já se viu… tem louco pra tudo nesse mundo.
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