Simplicíssimo

Teatro dos Vampiros II

São Paulo, 09 de maio de 2006.

TEATRO DOS VAMPIROS II

Sem muito o que fazer, sem muito o que comer, sem emprego, sem escola, a única saída da gente foi ver televisão. Não sei o que seria da nossa vida sem essa caixinha preta. Nossa, é tão legal assistir nas novelas aquela gente bonita, bem vestida, bem nutrida, bronzeada. É tão legal ver no final que os bandidos safados vão pra cadeia, ou, melhor ainda, morrem. Os bonzinhos bonitinhos casam e ficam felizes…

Aos domingos, o que não falta é opção. É tão emocionante as homenagens que eles fazem praqueles atores. A maioria deles acabaram de sair da Malhação, e já são grandes figuras humanas, conforme diz o apresentador… Sempre sai choro, e a gente aqui em casa chora junto.

E quando eles escolhem um mendigo na rua pra presentear? A gente vibra de felicidade. Eles dão casa, carro, dinheiro, móveis, emprego, e tudo de bom que o sujeito vai perder em dois meses. Pena que a gente não saiba escrever pra mandar uma carta e ser sorteado também. A vizinha disse que uma amiga da cunhada do irmão do patrão recebeu a visita de um cantor de pagode, e ganhou um monte de coisa, até penteado novo…

Tem noite que eu mal consigo dormir. Fico doida da vida com as maldades que os integrantes do BBB fazem só pra ganhar aquele dinheirão todo… Não sei pra que tanta briga, já que maioria vai posar pelada, dar entrevistas, participar de novelas, e ganhar muito mais.

O que eu mais gosto mesmo são aqueles programas onde a gente tem a chance de virar estrela. A amiga do vizinho da tia do padrasto do sobrinho do rapaz da rua de baixo participou. Rimos muito com o papel de ridícula que ela fez, com o esporro que tomou dos jurados, com a humilhação do choro de dez minutos na frente da câmera, para o Brasil inteiro ver. Dizem até que ela foi demitida da casa que fazia faxina… Mas valeu à pena. Tem que tentar, gente. Na televisão é que eles são felizes. É outro planeta, que, se a gente puder entrar, não pode desperdiçar a chance. Ainda mais agora, que os traficantes tomaram a escola do bairro. Também, não ia dar tempo pros meninos estudarem, pois o horário não bate com o trabalho no farol da avenida.

Só não gosto do futebol que meu marido assiste umas duas vezes por semana. Sempre que o time dele perde, toma umas a mais no boteco e bate nos meninos e em mim… Também, coitado, a única alegria é a bola…

Parei até de ver jornal. Só sai morte, assalto, choro, tiros, enfim, um mundo feio que me lembra muito meu bairro. Ainda mais agora que resolveram falar mal do Lula, que, só porque é pobre como a gente, ficam inventando coisas… Resolvi que vou votar nele de novo, senão perco a cesta básica que ganho todo mês, e aí, nem televisão vou poder mais assistir, e isso eu não admito…

Marcos Claudino

Marcos Claudino

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