Simplicíssimo

A Máfia em Miniatura

 Sempre se fala e se alardeia sobre os grandes esquemas de corrupção. Sempre se diz que os políticos são corruptos. É folclórico e notório o ato de chamar os integrantes dessa classe de ladrões.

Falamos tanto, tanto dos bilhões que eles roubam e com razão. As mega-fraudes em geral são claras e cristalinas. Mas não se via, até bem pouco, ninguém falando dos bilhões de reais desviados por fraudes em miniatura. Elas são causadas por cidadãos comuns, sem grandes esquemas, no máximo contando com a ajuda de alguns familiares.

Estou falando das fraudes à previdência social. Podem alguns pensar que é mixaria fingir-se de doente para conseguir um auxílio-doença de 700 pilas por mês. Afinal, uma mega-corrupta como a Georgina não desviou alguns milhões? Realmente, se for ver o caso individual, nem parece tão grave.

Mas pensem no conjunto: no ano 2000, o gasto previdenciário com auxílio-doença foi em torno de 4 bilhões de reais. Ano passado subiu para cerca de 13 bilhões. É muito dinheiro, concordam? Pois é, temos vários cidadãos brasileiros, neste exato momento, se fingindo de doentes para receber o benefício.

         Muitos desses “doentes”, pasmem, estão trabalhando e bem. Usam o auxílio como renda extra. Outros não fazem nada, mesmo sendo capazes de trabalhar. Ficam literalmente “encostados”, que é o nome popular que se dá ao cidadão que recebe o auxílio-doença.

Ficar “encostado”, aliás pode ser economicamente vantajoso. O auxílio-doença, na maioria das vezes é superior ao salário que o trabalhador recebe na ativa.

As doenças na minha área estão entre as preferidas. É muito fácil fingir uma depressão. Temos muitos atores talentosos. Eles muitas vezes nos enganam bem direitinho. Se acontece de acreditarmos no paciente e prescrevemos medicação com efeito sedativo, melhor ainda para o simulador. Este pode deixar para tomar vários comprimidos horas antes do exame pericial do INSS, o que rende a ele uma clara aparência de doente.

Esta estratégia não difere muito da usada por aqueles que cortam fora um dedinho, para se “encostar” ou, quem sabe, se aposentar por invalidez. Ou daquele que jogava soda cáustica na sua úlcera, para que esta nunca sarasse. Ou do cardíaco que um dia antes da perícia parava de tomar seus remédios, para entrar em edema agudo de pulmão e ser periciado na sala de emergência. Os exemplos são muitos. Maus exemplos, aliás.

E ai de quem não dê ao fraudador aquilo que ele quer. Os médicos peritos do INSS recebem constantes ameaças de morte. Aquele mesmo cidadão que se dizia fraquíssimo, subitamente adquire forças para bradar, esmurrar, quebrar tudo. O Rio Grande do Sul é um dos campeões nacionais de agressão a médicos peritos do INSS.

Que fique claro, eu não trabalho para o INSS, mas o paciente sempre busca o especialista porque precisa do atestado para fazer o seu pedido de benefício. Ora, muitíssimas vezes, o simples fato de se ter depressão não justifica a alegação de incapacidade. Não mesmo! Mas eles não querem nem saber. Então também sou alvo de pressões e demandas as mais irreverentes. Eventualmente sou ameaçado.

A questão é complexa. Há, por exemplo, pacientes que têm ganhos com suas doenças, mas não se dão conta disso. É o que chamamos de ganho secundário, que o paciente tem sem se dar conta e não deve ser confundido com fraude ou simulação. Para não falar da dificuldade do sistema SUS/INSS em detectar eficazmente os casos de simulação. Beira à impotência e ao caos. Nisso falhamos nós os profissionais: somos deficientes na investigação da simulação. Tanto por desinteresse quanto por despreparo técnico.

Os resultados negativos são muitos. Os verdadeiros deprimidos, por exemplo, são discriminados, chamados de preguiçosos e coisas ainda piores. E claro, meus caros, há também o nervo da questão: o desvio fraudulento de verbas públicas promovido individualmente por milhões de brasileiros. E este dinheiro é pago por todos aqueles que preferem seguir trabalhando. Todos nós pagamos esta conta.

Vejam: o safado que se faz de doente para ganhar sem ter que trabalhar tira a grana do pobre do velhinho que passou a vida inteira trabalhando para receber uma miséria por mês. Cada cidadão brasileiro que pratica esta canalhice não passa de um mini-corrupto, um mafioso em miniatura. E os números estão aí para provar, são milhões de mini-corruptos. Milhões, milhões. Não milhares, milhões!

Eis aí uma bela demonstração de que o Congresso Nacional não é senão um reflexo da própria sociedade.

 

Ó vós, milhões de sanguessugas de todo o Brasil!

Por Deus, pelos céus, pelos oceanos!

Pelo berço atroz da miséria infinita,

Tomai vergonha na cara!… Basta!

 

Abraços,

Luiz Eduardo.

 

Luiz Eduardo Ulrich

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