Simplicíssimo

Único

  Após o primeiro ano deixou de procurar os porquês. O mundo parou. As pessoas sumiram.

Notou o primeiro sinal ao abrir a torneira da pia do banheiro, ao levantar-se. Seca. Viu que não havia eletricidade. Olhou pela janela. Carros parados no meio da rua. Silêncio. Celular, TV, rádio, conexão virtual. Nada.
O primeiro impulso foi sair. Tudo estava como qualquer manhã em seu bairro. As lojas abertas, as calçadas sujas. Menos as pessoas. Até os jornais do dia pendurados do lado de fora da banca de jornal da esquina, com as manchetes normais, como deveriam ser.
O primeiro impulso foi procurar os parentes, amigos próximos, as namoradas. Nada. As casas, os carros, os pertences lá estavam, mas nenhum sinal de vida, próxima ou distante.
A bordo de uma motocicleta percorreu o continente. Casou-se com uma boneca inflável e percorreu toda a América. Parava, comia, dormia onde entendia, prosseguia.
Três décadas passaram-se. O mundo era dele. Todos os conhecimentos, todas as sensações, paisagens, sem um único ser humano para compartilhar nada.
Os sinais naturais da vida começavam a mostrar que ela chegava ao fim. Despediu-se da esposa sempre silenciosa na beira do cais. Abasteceu uma lancha, colocou nela mantimentos para algumas semanas e partiu sem rumo. Não levou remos, não teria forças.
Sob um céu estrelado e claro e sobre um mar calmo fechou os olhos pela última vez.
O mundo finalmente conhecia a paz.

 

Marcos Claudino

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