Simplicíssimo

Hoje (8) – O Envelope

2007-01-07

Ando bastante intrigado com a carta que encontrei no lixo. Como
é que o destinatário da carta pode morar na Gandra e vir descartar o
lixo doméstico nas traseiras do centro comercial D. Dinis, quase no
centro de Leiria, a uns bons quilómetros de distância? É de supor que o
homem more perto do contentor do lixo. Ou, quiçá, tenha dado outra
morada para a correspondência. Pode também ter mudado de casa.
Mas a morada está incompleta: não tem rua e, muito menos, número
de porta. A Gandra, ainda assim, é uma zona extensa e não posso ir lá
perguntar por um tal de José Simplício da Silva aos passantes ou pelos
cafés. Será um sem-abrigo e põe o lixo em qualquer sítio mais a jeito?
Uhmmm! Pistas falsas forjadas pela máfia? Reparem que a máfia é
especialista em produzir pistas falsas. Nunca se soube, por exemplo, a
morada exacta do Bin Laden. Andará metido neste negócio da tintura?
A marca da tintura é árabe, Al-Ifar. Falta-me, além disso, uma palavra
para identificar o Instituto que enviou a carta ao JSS. Já procurei na Net
mas nada encontrei. Talvez tenha sido criado há pouco tempo para
calar algum ex-ministro com um ordenado chorudo, e ainda não tem
coordenadas em lado algum.
Preciso, urgentemente, de ajuda. Aceito sugestões quanto ao
remetente e ao destinatário da carta.

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2007-01-08

Hoje, vou andar a telefonar para todo o lado a ver se descubro
esse tal JSS ou o Instituto que lhe enviou a carta. Ou muito me engano,
ou essa é a chave de todo este mistério da tintura de iodo. O JSS deve
ser um elo importantíssimo nesta cadeia que conduz à tintura. Possuo
já, em relação a ele, informações valiosas que inferi da pesquisa
efectuada ao respectivo lixo. Em primeiro lugar, deve andar a pé
porque necessita também de tintura; é culto ou pelintra ou as duas
coisas porque faz uma alimentação racional. E tem dois endereços,
pelo menos.
Creio que a máfia já me anda a perseguir. Não, não vi ninguém
de quem pudesse desconfiar, mas hoje, quando me levantei para me
lavar, não havia água na torneira; nem uma pinga sequer. Isso significa
que vou ter que comprar água em garrafões de 5 litros e não terei
suficiente para tomar banho. Andam a boicotar-me o trabalho do lixo.
Espertíssimos, não há dúvida. Que ninguém tenha a veleidade de
pensar que consegue enfrentar a máfia.
Vou fingir que desisto da tintura. E vou telefonar de uma cabine
pública para não me identificarem, primeiramente para o 118.

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2007-01-08

Logo às 9 da manhã já eu estava na fila para comprar água no
Lidl. A máfia cortou a água ao bairro e, como já não há chafariz em
lado algum, as pessoas vão ao Lidl buscar garrafas de água. Métodos
da máfia. Mas podem estar certos que vou descontar o custo da água
na respectiva conta do fim do mês. E vão ter que me reembolsar,
porque eu comprei a água mais barata que lá havia. Há garrafas de 5
litros entre 39 cêntimos e 97 cêntimos. As de 97 cêntimos são da máfia
da Nestlé que diz que tem a melhor água de todas; como se a água
pudesse ser mais ou menos água, só porque leva o rótulo da Nestlé.
Que eu saiba, nenhuma delas é venenosa, logo: água é água. E o gosto
mais ou menos saboroso da água não é desculpa porque água que se
preze é inodora, insossa, incolor, etc.. Se pretender tornar a água
menos insossa, basta adicionar-lhe umas gotas de limão, e é isso que a
Nestlé faz. O papalvo diz que a água da Nestlé é mais saborosa, e leve,
e sei lá que mais. Marketing, tudo marketing, limão e ignorância do
povo. Se os tios querem exibir aos seus amigos a água da Nestlé, isso é
problema dos tios. Mas o povo devia saber que não há água de
primeira ou de segunda. Desde que seja água pura, toda ela se bebe. A
água da torneira, que às vezes traz cloro de mais (e sabe mal), melhora
substancialmente com umas gotinhas de limão, e não faz mal nenhum
à saúde, antes pelo contrário, tem ferro q.b..
Fui, depois, ao local do crime. Isto é, fui mais uma vez à zona do
contentor de onde retirei o frasco de tintura que já aqui vos mostrei.
Fica, como já referi, nas traseiras do Centro Comercial D. Dinis, numa
rua que só hoje vi como se chamava:
“Rua Coronel Artur de Paiva, Grande herói das campanhas
coloniais, nascido em Leiria a 9 de Março de 1856 e falecido
a 1 de Outubro de 1900 no alto mar quando regressava à
Pátria“.
Juro pela alma da minha mãezinha que Deus tem que é este o
nome da rua. Tivesse eu uma máquina fotográfica e poderia prová-lo.
Creio que o mistério da tintura se está a desvendar. Perante
semelhante nome de rua, o Instituto que enviou a carta deve ter
simplificado e, em vez de Grande, escreveram Gandra, gandra rua…
Um homem que passava e me viu a tomar nota do nome da rua,
comentou:
– Mais um…
– Como? – perguntei-lhe.
– Toda a gente que aqui passa, põe-se a tirar notas ou fotografias
dessa placa. Ainda não percebi o que é que escreveram mal.
– Nada! Só que há ruas que nem número têm e esta tem quase
um livro.
O homem demorou um nadinha a compreender a piada mas
logo me convidou para um copo na tasca mais próxima. Claro que
aproveitei, no meio da conversa poderia o nome de JSS vir à baila.
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Henrique Sousa

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